sábado, 27 de dezembro de 2014

Rainha dos Profetas

De Maria nunquam satis. Esta frase, que ressoou nos lábios e nos corações de tantos santos ao longo da História, aponta para o oceano insondável de perfeições da Mãe de Deus, em cujos maravilhosos mistérios a Teologia sempre se aprofundará, sem jamais esgotá-los.
De fato, luminosas nuvens de mistério envolvem os diversos episódios da existência da Santíssima Virgem, como a sua Assunção e consequente Coroação como Rainha do Céu e da Terra.
Que relação se poderia estabelecer entre esses augustos acontecimentos, a ordem do universo e a História?
Considerando que Maria Santíssima é a mais excelsa das meras criaturas — pois Jesus é Homem-Deus —, todas as operações humanas tomam n’Ela um caráter especial, paradigmático e sublime.
O nascimento d’Ela, como causa do nascimento do Menino Jesus, foi o nascer dos nasceres. Em seu claustro virginal, o Verbo Se fez carne e habitou entre nós; pelo que, o conceber d’Ela foi o gerar dos gerares. Por vontade de Deus, Ela teve a mais suave das mortes, intitulada de “Dormição” pela Teologia. Sua ressurreição foi esplendorosa, mas não à maneira de um estampido, porque não era removida nenhuma pesada laje, mas apenas dissipava-se um leve sono pelo qual Ela havia passado. E, por fim, entre as meras criaturas, quem conheceu e amou a Deus como Ela?
Na vida espiritual, por sua vez, cada progresso de Nossa Senhora, de algum modo, era um nascimento, um crescimento, um apogeu que dava origem a outro nascimento, a outro crescimento, a outro apogeu, excetuada, é claro, a morte no sentido da perda da vida da graça.
A ação de Maria na História se desenvolve de modo a todas essas operações se centralizarem em Nosso Senhor e atingirem seu ápice no Céu, após a Assunção, ao ser coroada pela Santíssima Trindade como a Rainha do Universo.
Nesta vocação de conduzir tudo ao Pai Eterno, a Nosso Senhor Jesus Cristo e ao Divino Espírito Santo, encontra-se o dom profético de guiar, animar e fazer com que se realizem os planos divinos. Isso faz de Maria a Profetiza de toda a Criação.
Assim, a invocação “Rainha dos Profetas” reveste-se de um significado especial, porque é a
Rainha de todos os acontecimentos da História. Daí vem a particular nobreza deste título, pois se trata da realeza das realezas, enquanto dando impulso a todo o acontecer histórico.
Maria é a Rainha de todos os nasceres, de todos os felizes e ascensionais desenvolvimentos, cheia de desvelo nos delicados períodos de crepúsculo, e repleta da glória de tudo quanto ressurge de dentro do anoitecer.
Por isso, se algo vai nascendo e desejamos para isso uma particular intensidade de viço, se alguma coisa vai indo bem e queremos que chegue ao seu progresso total, sem os mil desfalecimentos do caminho, devemos recorrer a Ela enquanto Rainha dos acontecimentos. E se algo tem que passar por eclipses, quando tudo parecer perdido, a Estrela d’Alva, ainda é Ela, que pode atrair a manhã e fazer tudo recomeçar.
Poder-se-ia perguntar, então, se o título de “Rainha dos Profetas” ou “Rainha da História” não A move especialmente.
Esta temática abre campo para outras belas indagações dentro da Mariologia:
Se todo caminho histórico tem magníficos nasceres, esplêndidos desenvolvimentos, terríveis eclipses e amanheceres ainda mais radiosos, não haveria uma forma de vida espiritual, de ritmo da própria vida sobrenatural em que a graça, como na natureza, ora instaura, ora confirma, ora prova, ora ressuscita e coroa? E que relação teria isso com o Segredo de Maria e com o Imaculado Coração d’Ela, fonte e impulso de todos os acontecimentos?

Eis cogitações próprias de uma devoção mariana considerada pelo prisma da Revolução e da Contra-Revolução.
Revista Dr Plinio - ago 2014

sábado, 20 de dezembro de 2014

Fortaleza de Maria

Continuação dos comentários ao Pequeno Oficio de Nossa Senhora
De torres fortalecida,
Por David entrincheirada, e de armas também munida.
Refere-se aqui às fortificações com que David protegeu sua cidade, Jerusalém. A tais defesas se refere Salomão, no Cântico dos Cânticos, ao comparar a formosura da Esposa com a “torre de David, que foi edificada com seus baluartes; dela estão pendentes mil escudos, toda a armadura dos heróis” (Cânt. IV, 4). São outros símbolos e representações de Maria Santíssima.
Inexpugnável fortaleza
Com efeito, “que cidade ou castelo há, mais forte, mais sólido e mais formoso que a sacratíssima Virgem? Cuja alma confirmou Deus em graça tão soberanamente que jamais se apartou d’Ele, nem em suas palavras, nem em suas obras, nem em seus pensamentos. Que torre tão inexpugnável foi aquela alma santíssima, à qual o demônio não pôde conquistar com todos seus enganos e ataques!
“Mais ainda: nem sequer ousou invadir seu interior; jamais conseguiu o demônio tornar-se dono de uma só ameia deste castelo. Castelo este não apenas invencível, mas também invulnerável; pois, embora haja sofrido perseguição por parte do inimigo, jamais teve tentação relacionada com a carne, como está escrito: Abimelec não a tocou.
“Se começarmos a considerar o mundo, desde o princípio, e a discorrer através de todos os filhos de Adão, nada encontraremos mais estável, mais inabalável, mais constante do que esta sagrada Virgem. [...]
Verdadeira Torre de David
“D’Ela se lê nos Cantares: «Como a torre de David, que foi edificada com seus baluartes; dela estão pendentes mil escudos, toda a armadura dos heróis». Verdadeiramente torre de David, daquele David que com cinco pedras da torrente, isto é, com as cinco chagas e o báculo da Cruz, derrubou no monte Calvário ao soberbo Golias que se gloriava de sua força.
“Converteu-se esta torre em baluarte da Igreja e refúgio único de pecadores, a fim de que a Ela se dirijam todos os réus, todos os tristes, todos os aflitos, e com sua proteção se livrem do inimigo.
“O homem! em qualquer tribulação, refugia-te em Maria: angustiado pelos pecados, atormentado pelas perseguições, ou perturbado pelas tentações, dirige-te a esta torre, refugia-te em Maria. Dela estão pendentes mil escudos: e encontrarás n’Ela um seguríssimo escudo para te defender contra as investidas de todas as tribulações e contra a aparição do demônio que te persegue, posto que n’Ela estão as armaduras de todos os heróis: encontra-se em Maria a fé dos apóstolos, a fortaleza dos mártires, a pureza das virgens, a sabedoria dos doutores, a pobreza dos anacoretas, a devoção dos confessores; n’Ela, em uma palavra, encontra-se reunida a virtude de todos os Santos. Pois a nenhum destes se lhe concedeu, por especial privilégio, coisa alguma que não brilhe mais excelentemente em Maria, desde o princípio de sua vida.

“Eis aqui o fortíssimo castelo, eis aqui a torre inexpugnável, que jamais pagou tributo ou rendeu obediência ao demônio” 
Continua no próximo post

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Maria: Onipotente auxílio contra o demônio

Vejamos um significativo comentário do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, a respeito dessa inesgotável solicitude da Virgem Imaculada para com os homens:
“Nossa Senhora é seguríssimo refúgio e fidelíssimo auxílio de todos os que estão em perigo. Não há mãe verdadeiramente católica que não sinta receio pelo que possa suceder a seu filho.
“Ora, Maria Santíssima, a melhor de todas as mães, quanta solicitude não terá para com seus filhos que vivem neste mundo, sujeitos a toda sorte de riscos? Mais ainda. Concebida sem pecado original, confirmada em graça desde o primeiro instante de seu ser, Nossa Senhora é Aquela que esmagou a cabeça da infernal serpente. Ela pode, portanto, arrancar qualquer pecador das garras do demônio, e impedir toda influência que este procura ter sobre as almas.

“Esse insondável poder da Santíssima Virgem é uma razão de confiança e de alento para nossa vida espiritual. Em nossos momentos de tentação, nas horas em que temos medo de sucumbir ao pecado, lembremo-nos deste seguríssimo refúgio, deste fidelíssimo auxílio que nos oferece a Santa Mãe de Deus” 

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Maria, Refúgio dos pecadores: o testemunho de prolongada experiência

Continuação dos comentários ao Pequeno Oficio de Nossa Senhora
Em um de seus tocantes sermões, o Pe. Pinard de La Boullaye, renomado pregador jesuíta, assim se exprime:
“Que Maria seja toda bondade, não para com a malícia obstinada e a impenitência, ou seja, para com o pecado, mas para com os pecadores; que Ela seja o último recurso dos pobres escravos que desejariam sacudir o jugo de suas paixões e se afligem de não consegui-lo, dos culpados aos quais a clara consciência de seus desregramentos não aconselharia senão o desespero — verdadeiramente, isto não é uma invenção da imaginação humana, nem tampouco a conclusão de complica dos raciocínios. É uma convicção imposta aos fiéis por uma prolongada experiência.
“Interrogai os livros ascéticos, dos mais antigos aos mais recentes, das publicações populares até os tratados dos mais reputados doutores, encontrá-los-eis unânimes em provar, pelos mais variados exemplos, a extraordinária piedade que a Virgem demonstra em relação àqueles que A invocam. Ora Ela os ajuda de maneira quase sensível, através das confissões diferidas por longos anos; ora no leito da morte, Ela concede a graça da conversão, e assim arranca ao Inferno aqueles que deste estavam separados apenas por algumas horas ou poucos segundos; às vezes Ela intervém de maneira miraculosa para chamá-los ao arrependimento.
“Interrogai os confessores, especialmente os que vivem à sombra dos santuários consagrados a Maria; os missionários, sobretudo os que se aplicam em despertar esta devoção que quase todas as mães, felizmente, implantaram com cuidado na alma de seus filhos; os pregadores que asseguram à sua palavra, por ardentes súplicas, o apoio da grande Convertedora. Eles serão unânimes em vos afirmar que resta ao menos uma esperança de salvação, enquanto subsistir numa alma uma centelha — sim, não mais que uma centelha — de piedade em relação à Virgem. [...]
Merecido título de Maria
“Perscrutai as profundezas do Céu. Procurai descobrir, seja entre os Santos, seja entre os Anjos, um só protetor — exceção feita unicamente de Jesus Cristo — que possa intervir em nosso favor com caridade e convicção semelhantes [às de Maria].

Se sois obrigados a desistir de encontrá-lo, não deveis convir que prodígios de misericórdia atestados por tantos testemunhos se explicam sem dificuldade, que a fé dos séculos cristãos se acha amplamente justificada, que Maria, numa palavra, merece verdadeiramente o título de «Refúgio dos pecadores» posto que os maiores culpados, aqueles cujos apelos o mais misericordioso dos eleitos poderia ser tentado a rejeitar, têm a certeza de n’Ela encontrar uma Advogada pronta a defender sua causa, com o apaixonado afeto de uma mãe?” 

domingo, 30 de novembro de 2014

Invoquemos a Maria


A prudente Virgem não buscava sabedoria, como Salomão; nem riquezas, nem honras, nem poder, mas graça. Na verdade, só pela graça nos salvamos. Para que desejamos, nós, irmãos, outras coisas? Busquemos a graça, e a busquemos por Maria, porque Ela encontra o que procura e não pode ver-se frustrada.


São Bernardo

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Maria: Refúgio dos pecadores

Refúgio sempre aberto aos pecadores e às almas fiéis
Ainda, interpretando a citada passagem da Escritura, escreve o Pe. Jourdain:
“Maria é a cidade de refúgio para a qual devem fugir todos os que desejam evitar a morte. Os refúgios outrora preparados pelos filhos de Israel, só podiam salvar a vida dos assassinos no caso de estes terem cometido um homicídio involuntário, não sendo eles, portanto, realmente culpados.
“Deus, na sua infinita misericórdia, preparou-nos em Maria um refúgio seguro. Por mais culpado que seja um pecador, se ele recorrer à proteção de Maria, a justiça de Deus deterá o castigo que já lhe reservara, e aquele que não tinha a esperar senão os rigores da cólera divina, obterá o perdão, voltará a ser filho de Deus, e reencontrará seus direitos à herança celeste. O pecador não terá que fazer uma longa e perigosa viagem para encontrar esse bem-aventurado refúgio.
Maria espera sempre os pobres culpados, e seu coração está constantemente aberto para recebê-los. [...1
“Os fugitivos do Senhor são, ainda, os servidores de Deus, aos quais o mundo e o Inferno perseguem com seu ódio, e as mais variadas tentações inquietam, expondo-os ao perigo de se perderem. Também — e sobretudo — para eles, Maria abre inteiramente o asilo de sua misericórdia. Ela será sua defesa, seu amparo e sua consolação” . 3
Proteção jamais recusada
À Soror Josefa Menéndez (1890-1923), religiosa coadjutora da Sociedade do Sagrado Coração de Jesus, disse a Santíssima Virgem:
“O meu mais belo título de glória é o de ser Imaculada ao mesmo tempo que Mãe de Deus. Mas, alegra-me principalmente unir a este título o de Mãe de misericórdia e o de Mãe dos pecadores” 4.
Fiéis intérpretes deste sentimento de Maria, não se cansam os Santos e os autores espirituais de louvá-La enquanto Refúgio dos Pecadores. À guisa de exemplo, citemos, entre outros:
Santo Efrém: “Ave, refúgio e receptáculo dos pecadores, no qual unicamente pode um culpado achar proteção e salvamento” 5.
O piedoso Bernardino de Busti exclama: “O pecador, ainda quando tivesses cometido todos os crimes, resguarda-te de perder a confiança; mas recorre com segurança a essa gloriosíssima Soberana. Só Lhe acharás cheias as mãos de misericórdias e de benefícios: porque Ela deseja mais fazer-te bem e derramar sobre ti as suas graças, do que tu podes desejar recebê-las” 6
D. Luís Blósio (sec. XVI), Abade beneditino de Liesse, Bélgica:
“Porque Maria é o único recurso dos que ofenderam a Deus, e o único refúgio seguro de todos os que gemem sob o peso das tentações [...], por isto quando Ela os ouve de todo o coração pedir-Lhe o socorro, imediatamente os acolhe e lhes alcança o perdão do Divino Filho” 7.
O Pe. Lacroix, de quem recolhemos os testemunhos acima, acrescenta: “E impossível que um pecador sincera e confiantemente recorra a Maria, para reaver a Jesus, sem ser atendido. Isto é inaudito, e soa como blasfêmia! A Virgem Maria é realmente o seguro refúgio dos pecadores, e a devoção a Ela é o melhor sinal e plena garantia de salvação e predestinação”8 .
3) JOURDAIN, Z.-C. Somme des Grandeurs de Marie. Paris: Hippolyte Waizer, 1900. Vol. I. p. 507, 655.
4) MENÉNDEZ, Josefa. Apelo ao Amor. 3. ed. Rio de Janeiro: Rio-S. Paulo, 1963. p. 598-599.
5) LACROIX, Pascoal. A Virgem Maria, Seguro refúgio dos pecadores. Petrópolis: SCJ, 1935. p. 42.
6) Idem, 56.
7) Idem, p. 57.
8) Idem, p. 28.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

A verdadeira cidade de refúgio

Comentários ao Pequeno Ofício da Imaculada 
Cidade sois de refúgio
Concluída a divisão da terra de Canaã entre as doze tribos de Israel, o Senhor disse a Josué (Jos. XX, 1-4):
“Fala aos filhos de Israel e dize-lhes: Separai as cidades para os fugitivos, das quais vos falei por meio de Moisés: a fim de que se refugie nelas todo o que matar uma pessoa sem querer; e possa evitar a ira do parente próximo do morto, que quiser vingar o seu sangue. Quando ele se refugiar em uma destas cidades, apresentar-se-á à porta da mesma, e exporá aos anciãos dela tudo o que possa comprovar a sua inocência; e desse modo o receberão, e lhe darão lugar em que habite.”
A verdadeira cidade de refúgio
Essas cidades que a demência divina reservou como asilo para os fugitivos, simbolizam Aquela que é, por excelência, o Refúgio dos pecadores. Assim o ensina Santo Afonso Maria de Ligório:
“Havia na Judéia, outrora, cidades de refúgio, nas quais os culpados podiam abrigar-se e ficavam a salvo das penas merecidas. Agora já não há tantas cidades de refúgio como antigamente: Só há uma que é Maria Santíssima, da qual [se escreveu]: Coisas gloriosas se têm dito de ti, ó cidade de Deus (Sl 86, 3).
“Existe aqui uma diferença, porém. Nas antigas cidades de refúgio não havia asilo para todos os culpados, nem para toda sorte de delitos, enquanto que sob o manto de Maria acham refúgio todos os pecadores e toda espécie de delito. Basta que a Ela se recorra, para se estar a salvo. «Sou cidade de refúgio para todos que a Mim recorrem», faz São Damasceno dizer nossa Rainha. Só se exige que a Eia se recorra. «Ajuntai-vos e entremos na cidade fortificada e guardemos aí silêncio» (Jer. 8, 14). Esta cidade fortificada, explica Santo Alberto Magno, é a Santíssima Virgem, fortificada em graça e em glória.
“«Guardemos aí silêncio» — a isso observa a Glosa: Já que nós não temos de pedir ao Senhor, basta que entremos nesta cidade, e nos calemos; porque Maria falará e rogará por nós. Exorta por isso Benedito Fernandes todos os pecadores a se refugiarem sob o manto de Maria, dizendo: Fugi, ó Adão, ó Eva, fugi, ó filhos seus que tendes ofendido a Deus, fugi e refugiai-VOS no seio desta boa Mãe. Não sabeis que é Ela a única cidade de refúgio e a única esperança dos pecadores?
“Também nos sermões atribuídos a Santo Agostinho, Maria é chamada nossa única esperança.

“Da mesma forma exprime-se Santo Efrém: «Vós sois a única advogada dos pecadores e daqueles que precisam de todo o socorro. Eu Vos saúdo como asilo e refúgio no qual ainda podem os pecadores achar salvação e acolhimento»” 2
2) LIGÓRIO, Afonso Maria de. Glórias de Maria Santíssima. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 1964. p. 80-81.

domingo, 16 de novembro de 2014

Pequeno Ofício - Hora Noa

Pequeno Ofício da Imaculada Conceição
NOA
HINO
Cidade sois de refúgio, de torres fortalecida,
Por David entrincheirada, e de armas também munida.
Bem não éreis concebida, em caridade abrasada,
Foi do dragão a soberba, por Vós, ferida e humilhada.
Sois a bela Abigail, Judith invicta e animosa,
Fostes do vero David Mãe terna, Mãe carinhosa.
Raquel ao Egito deu prudente-governador,
A Virgem das virgens deu ao mundo o seu Salvador. Amém.
Comentário
A Revolução tem como mentor o demônio, e por isso ela é o que há de mais vil na Terra; é um movimento que se arrasta — como a diabólica serpente — em meio aos vícios e pecados humanos, por entre aquilo que há de sórdido, feio, torto e abjeto, neste vale de lágrimas.
“Nossa Senhora é Aquela que aterroriza esse perigoso e infame adversário, porque Ela é em tudo o oposto da Revolução.
“Maria Santíssima é a Virgem-Mãe do Salvador com tudo quanto é digno, belo, nobre e santo reunido para adorná-La. Ela possui graus de esplendor de pureza e de perfeições inimagináveis!
E o contrário da maldita serpente, cuja cabeça Ela traz, continuamente, esmagada sob seus pés” 1
Encontra-se, nestas palavras do Prof Plinio Corrêa de Oliveira, uma perfeita síntese dos comentários que se poderiam fazer sobre a Hora Noa do Pequeno Oficio.
Os acentos deste Hino evocam, primordialmente, o poder vitorioso da Santíssima Virgem. Ela é a cidade fortificada, o seguro refúgio dos pecadores. E a inexpugnável Torre de David, revestida de escudos e armaduras de heróicos guerreiros, símbolos das excelsas virtudes de Maria, nunca atingidas pelos ataques do infernal inimigo.
Abrasada no amor a Deus, desde o primeiro instante de sua Imaculada Conceição, Nossa Senhora quebrantou — e para todo o sempre esmagará — a soberba do demônio.
Na Hora Noa surgem três insignes filhas do povo eleito, figuras da Bem-aventurada Virgem: a bela Abigail, que representa a onipotência suplicante de Nossa Senhora; a heroica Judith, imagem da fortaleza e do poder d’Aquela que venceu o demônio; e Raquel, mãe de José, governador do Egito, que simboliza a Santíssima Mãe
do verdadeiro Salvador do mundo.
O Hino se encerra com uma enlevada homenagem à excelsa formosura — espiritual e física — da Imaculada Conceição.

1) CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Conferência em 31/1/1989. (Arquivo pessoal).

domingo, 9 de novembro de 2014

Como um lírio entre os espinhos

V Como um lírio entre os espinhos,
R. Assim a minha predileta entre os filhos de Adão
A Imaculada Conceição, lírio entre os espinhos
Acompanhemos o Pe. Tiago Nouet, jesuíta do século XVII, em seu brilhante comentário à passagem do Cântico dos Cânticos (II, 2), que deu origem ao louvor aqui tributado a Maria Santíssima. Assim se exprime aquele douto pregador:
“A concepção de todos os homens que nascem pela via ordinária da geração, é acompanhada de três grandes desordens, a saber: a privação da graça santificante que nos torna filhos de Deus; a privação da justiça original, que consiste numa perfeita subordinação da parte inferior à parte superior do homem; e um violento pendor que temos para o mal, unido à dificuldade que encontramos na prática do bem.
“Ora, a concepção da Bem-aventurada Virgem foi isenta de todos esses infortúnios, por um singular favor de Deus, que a distingue de todas as outras, e faz aparecer Maria entre os filhos dos homens, como o lírio entre os espinhos. Ela foi concebida no estado de graça, na justiça original, isto é, numa perfeita subordinação de todas as suas potências à razão, e desta a Deus. Ela foi concebida sem qual quer inclinação para o mal, e com uma forte tendência para toda sorte de bem. [...]
A única sem o labéu do pecado
“O lírio é belo em virtude de sua brancura; os espinhos não têm beleza alguma. É a primeira diferença entre a concepção da Bem-aventurada Virgem e a de todos os filhos de Adão, que nascem no pecado, cujo labéu os torna objeto de abominação diante de Deus. Porque ninguém está isento de mancha, nem mesmo o recém-nascido. Somente da Bem-aventurada Virgem pôde dizer o Espírito Santo: «Sois toda formosa; em vós não há mácula».
“Sois toda bela, não em parte, mas toda, sem exceção e sem reserva. Não há, portanto, nódoa alguma em Vós, nem de pecado venial, nem de pecado mortal, nem de pecado original. Nunca houve, e jamais haverá. Sois e sereis sempre cheia de graça. [...]
Isenta dos espinhos da concupiscência
“O lírio não tem nó, tudo nele é suave e liso, desde a haste até à flor. Os espinhos, pelo contrário, são rudes e picantes, furam e dilaceram quem os toca.
“É a segunda diferença entre a concepção da Bem-aventurada Virgem e a de todos os homens, que estão sujeitos aos picantes aguilhões da concupiscência, da qual Ela foi inteiramente isenta. [...]
“Com efeito, exigia a honra do Filho de Deus e a de sua Santíssima Mãe, que Esta tivesse um tal domínio sobre suas paixões, e que a par
te inferior de sua alma fosse de tal maneira submissa à razão que, não só não cometesse Ela pecados atuais, mas também que não pudesse pecar. [...j .
“Admirai, pois, o privilégio de Maria que, única, recebeu este singular favor: n’Ela nunca reinou nem habitou o pecado. [...]
Fortíssima inclinação para o bem e completa aversão ao mal
“O lírio é aprumado e se eleva muito alto. Não há flor que tende a se afastar mais da terra, enquanto que os abrolhos e os espinhos nesta rastejam.
“É a terceira diferença entre a concepção da Bem-aventurada Virgem e a do comum dos homens, que o pecado original abandona como vítima à cegueira do espírito, à malícia do coração, à fragilidade da carne, ao desregramento das paixões e à desordem dos sentidos e da imaginação, donde nascem este pendor que temos para o mal e a dificuldade que sentimos na prática da virtude, este apego que temos à Terra, e o trabalho que nos custa o dirigir nossos pensamentos às coisas celestes. Porém, a plenitude da graça que a Bem-aventurada Virgem recebeu no momento de sua concepção tinha dois efeitos inteiramente opostos. Esta Lhe dava uma suavíssima e fortíssima inclinação para o bem, e uma extrema aversão ao mal; um maravilhoso pendor para o Céu, e um perfeito desapego de todas as coisas da Terra. Pois, como diz São Tomás, pode-se considerar a santidade, enquanto nos aproxima de Deus, e é a caridade; ou enquanto nos afasta do mal, e é a pureza. Uma e outra existiram em Maria num grau eminente, mas com esta diferença: que Ela podia crescer em caridade até ao último suspiro de sua vida; porém, quanto à sua pureza, estava Ela no último grau de excelência, e, abaixo de Deus, não podia haver maior” 1
Glória do jardim de espinhos
Assim, compreendemos o cântico do monge e poeta medieval, Adão de São Vítor:
“Salve, pois, ó Mãe do Divino Verbo, Flor que brotou entre os espinhos, sem espinho; glória do jardim de espinhos, O espinheiral, somos nós; fomos ensanguentados pelos espinhos dos pecados. Mas, para tua pessoa, não existem espinhos” 2
Lírio que nunca foi espinho
E Santo Afonso de Ligório, comentando a invocação Mater purissima, da Ladainha Lauretana, escreve: “Esta Virgem Mãe ... é chamada lírio entre os espinhos. Todas as outras virgens, diz Dionísio o Cartuxo, são espinhos, ou para elas mesmas ou para os outros; mas a Bem-aventurada Virgem nunca foi um espinho, nem para Ela, nem para os outros, pois a todos os que A fitavam, Ela só inspirava sentimentos puros e santos. Além disso, o autor que escreveu a Vida de São Tomás de Aquino, relata que o santo Doutor dizia que as próprias imagens de Maria extinguem os ardores da concupiscência naqueles que as contemplam com devoção. E São João de Avila atesta que muitas pessoas, tentadas contra a castidade, conservaram-se puras pela devoção a Maria” 3
1) NOUET, Tiago. L’Homme d’oraison, Méditation pour le jour de la Conception Immaculée de la B. Vierge. Apud JOURDAIN, Z.-C. Somme des Grandeurs de Marie. Paris: Hippolyte Waizer, 1900. Vol. V. p. 92-95.
2) SÃO VÍTOR, Adão de. Prosa per l’Assunzione della B. M. V Apud ROSCHINI, Gabriel. Instruões Marianas. São Paulo: Paulinas, 1960. p. 133.

3) LIGÓRIO, Afonso Maria de. Oeuvres Complètes. 10. ed. Tournai: Casterman, 1880. Vol. VIII. p. 180.

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Todas as graças reunidas em Maria

 Continuação dos comentários ao Pequeno Oficio de Nossa Senhora
Toda a graça celestial
Em uma de suas expressivas passagens, escreve São Luís Grignion de Montfort:
“Deus Pai ajuntou todas as águas e denominou-as mar; reuniu todas as suas graças e chamou-as Maria. Este grande Deus tem um tesouro, um depósito riquíssimo, onde encerrou tudo que há de belo, brilhante, raro e precioso, até seu próprio Filho; e este tesouro imenso é Maria, que os Anjos chamam o tesouro do Senhor, e de cuja plenitude os homens se enriquecem” 1.
Oceano de graças
Inspirado nessa sentença montfortiana, comenta o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira:
“Nossa Senhora é verdadeiramente um oceano de graças. Assim como o mar está para as outras águas, assim está Ela em relação aos outros homens, pela abundância e a imensidade de dons celestiais com que foi enriquecida por Deus.
“E assim como todas as águas, em última análise, correm para o grande oceano, também todas as graças nos são concedidas, e chegam até nós, pela intercessão de Maria Santíssima” 2
Coroada de graças, virtudes e belezas
Outra bela consideração sobre a plenitude de graças de Nossa Senhora, devemos a Santo Antônio Maria Claret:
“Maria foi como o centro de todas as graças e belezas que Deus havia distribuído aos Anjos, aos Santos e a todas as criaturas. Maria havia de ser a Rainha e Senhora dos Anjos e dos Santos, e por isso mesmo deveria ter mais graças que todos eles, já no primeiro instante de seu ser.
“Maria havia de ser Mãe do próprio Deus. É um princípio de filosofia que entre a forma e as disposições da matéria deve existir certa proporção: a dignidade de Mãe de Deus é aqui como a forma, e o coração de Maria é a matéria que há de receber esta forma. O, que cúmulo de graças, virtudes e outras disposições se reúnem naquele santíssimo e puríssimo coração!...
“Desde que Deus determinou fazer-se homem, fixou a vista em Maria Santíssima, e a partir de então dispôs todos os preparativos necessários: fê-La nascer dos patriarcas, profetas, sacerdotes e reis, e todas as graças destes reuniu em Maria, e quis que fosse o creme e a flor de todos eles. Ademais, ornou-A com bênçãos de doçura e pôs sobre sua cabeça uma coroa de pedras preciosas, isto é, de graças e belezas” .3
Aqueduto repleto de graça divina
Celebrando a natividade de Nossa Senhora, São Bernardo assim se refere Aquela que possui toda a graça celestial:
“Quem é a fonte da vida, senão Cristo Senhor? [...] Na verdade, a própria plenitude se humilhou a si mesma, a fim de se tornar, para nós, justiça, santificação e remissão. [...] Correu a fonte até nós e se difundiram as águas nas praças. Desceu por um aqueduto aquela veia celestial, [...] infundindo em nossos áridos corações as gotas da graça, a uns, certamente, mais; a outros, menos. O aqueduto, sem dúvida, cheio está para que os demais recebam da [sua] plenitude.
“Já percebestes, se não me engano, quem é este aqueduto que, recebendo a plenitude da própria fonte do coração do Pai, no-la franqueou, se não do modo como é em si mesma, ao menos conforme podíamos dela participar. Sabeis, pois, a quem se disse: «Deus te salve, cheia de graça». [...]
“Contemplai, mais altamente, com quanto afeto de devoção quis fosse honrada Maria por nós, aquele Senhor que n’Ela depositou toda a plenitude de bem, para que, consequentemente, se em nós algo exista de esperança, algo de graça, algo de salutar, conheçamos que redunda d’Aquela que subiu (aos Céus) inebriada de delícias. [...]

“Achastes, disse o Anjo, graça aos olhos de Deus”. Ditosamente. Sempre Ela encontrará a graça, e só a graça é o de que necessitamos. A prudente Virgem não buscava sabedoria, como Salomão; nem riquezas, nem honras, nem poder, mas graça. Na verdade, só pela graça nos salvamos. Para que desejamos, nós, irmãos, outras coisas? Busquemos a graça, e a busquemos por Maria, porque Ela encontra o que procura e não pode ver-se frustrada” 4.
1) GRIGNION DE MONTFORT, Luís Maria. Tratado da Verdadeira Devoção à Santissima Virgem. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 1961. p. 30.
2) CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Conferência em janeiro de 1966. (Arquivo pessoal
3) CLARET, Antônio Maria. Escritos Autobiograficos y Espirituales. Madrid: BAC, 1959. p. 767-768.
4) BERNARDO. Obras Completas. Madrid: BAC, 1953. Vol. I. p. 739-742

domingo, 19 de outubro de 2014

Há em Vós, singular Virgem

Continuação dos comentários ao Pequeno Oficio de Nossa Senhora
 Há em Vós, singular Virgem
“Nossa Senhora é a Virgem Singular, isto é, virgem como ninguém o foi, nem o será jamais. Ela é a Santa Virgem das virgens, Aquela cuja virgindade é tão excelsa que, perto dela, torna-se pálida a intacta castidade das outras virgens. Nossa Senhora é a Virgem suprema, inesgotavelmente perfeita, inimaginavelmente grandiosa!”
Virgindade rara e única
Compartilha esta convicção o Pe. Jourdain, que escreve:
“Maria é chamada Virgem das virgens, porque sua virgindade não é semelhante à comum. A sua é rara, única, ilustre e desconhecida em todos os séculos, em todo o universo. E rara, pois Maria é, ao mesmo tempo, Mãe e Virgem; Ela teve um Filho que não possui pai segundo a natureza, é o Espírito Santo, o Esposo Celeste, que n’Ela opera. [...]
“A virgindade de Maria é única. Longe de ser estéril, só ela é fecunda; só ela ignora os males e as enfermidades da natureza. Somente Maria porta a coroa da virgindade realçada pelo fulgor de uma rica maternidade: [...j Mãe de Deus e perpetuamente Virgem, sem exemplo, sem igual.
“Assim, a Igreja A chama em seus hinos: Virgo singularis, Virgem singular, Virgem única. Ela o é, verdadeiramente, pois a natureza e mesmo a graça jamais produziram tal; nunca o mundo viu outra semelhante; e jamais inteligências humana e angélica conceberam nada de mais belo. Ela é realmente singular, pois entre todos os Santos é a mais santa, entre todas as virgens puras, é a mais pura.
“Ela é o prodígio do Céu, o espelho da virtude, a alegria do Paraíso e da Terra” .
Fundadora da virgindade
E o ardoroso São Tomás de Villanueva saúda a Virgem singular como sendo a fundadora da virgindade: “O régia Virgem, tendes a primazia entre as virgens, fostes a inspiradora e mestra das virgens, o troquel da virgindade, a autora e fundadora da mesma, a primeira desta sagrada religião. [...]
“Ó Virgem pura, Virgem única, Virgem singular! Realmente singular e única, ante a qual não se pode apresentar dignamente virgem alguma, e em cuja comparação toda outra virgindade poderia parecer corrupção. [...]

“Virgem sagrada, pura e imaculada, com o privilégio sobre as demais de tornar puros, por assim dizer, a quantos A fitassem, pois tinha Ela, usando as palavras do Profeta, a virgindade que engendra virgens (Zac. IX, 17)” .

terça-feira, 14 de outubro de 2014

“Porta do Céu, abri-vos para mim!”

O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira nos recomenda a confiança n’Aquela que é a entrada oriental do Paraíso:
“Nossa Senhora é a porta do Céu. E por meio d’Ela que Nosso Senhor Jesus Cristo passou do Céu para a Terra, e é através d’Ela que os homens passam do mundo para o Céu. E por essa porta que todas as nossas orações chegam até Deus, e é por meio d’Ela que obtemos as graças necessárias para a nossa salvação.

“Assim, em todos os dias de nossa vida e, sobretudo, no momento em que estivermos para entrar na eternidade, a Ela devemos dirigir esta filial e confiante súplica: «Porta do Céu, abri -vos para mim!»” 

sábado, 11 de outubro de 2014

Consagração do Brasil ao Imaculado Coração de Maria

Atendendo ao convite dos beneméritos Padres Cordimarianos, em 31 de julho de 1943, Dr. Plinio prestou sua contribuição para a gloriosa campanha em prol da consagração do Brasil ao Coração Imaculado de Maria:
Uma das características da devoção que devemos tributar a Nossa Senhora consiste, sem dúvida, em ser terna. Entretanto, a devoção não se faz somente de ternura, de efusões sentimentais e afetivas. É indispensável, outrossim, ter bons e sólidos conhecimentos sobre a posição de Maria Santíssima na economia da graça divina, para que a devoção mariana se torne sólida e perfeita. Ora, a consagração do Brasil ao Imaculado Coração de Maria constituiria excelente oportunidade para se divulgar, com método e perseverança, os admiráveis ensinamentos da Santa Igreja sobre tão fundamental matéria.
Assim sendo, jamais será suficiente encarecer a importância desta providencial consagração, pois é possível que alguns católicos não percebam desde logo o que ela significa.
Quando a Igreja promove a consagração de nações, dioceses, famílias ou pessoas ao Coração Sacratíssimo de Jesus, ou ao Imaculado Coração de Maria, tem ela em vista que as criaturas assim consagradas formulem a resolução de pertencer-Lhes de modo particular, obedecendo-Lhes mais fielmente, tomando-Os mais perfeitamente por modelo, e, reciprocamente, recebendo de modo  todo especial sua particular e  vigilante atenção.
Mas, é preciso acentuar: os que propugnamos pela consagração do Brasil ao Coração Imaculado de Maria, se bem que apreciemos no seu alto e devido valor estes frutos de tão solene ato, temos em  vista um resultado muito mais alto e profundo.
Queremos que nossa Pátria seja consagrada ao Coração Imaculado de Maria, antes de tudo e acima de tudo, porque Maria Santíssima tem direito a esta homenagem. A realeza de Nossa Senhora, em função da realeza de seu Divino Filho, não pode ser posta em dúvida pelos católicos. Rainha de todo o universo, Maria Santíssima já foi coroada Rainha do Brasil pela mão do ínclito Arcebispo do Rio de Janeiro, com coroa enviada especialmente pelo Santo Padre. Consagrado o Brasil ao Imaculado Coração de Maria, consagramos o reino ao Coração da Rainha e, com isto, fazemos um ato excelente de confiança filial em sua misericórdia, e, ao mesmo tempo, atraímos graças maiores e  mais abundantes para nossa Pátria.
Não se trata aí de meras figuras de literatura. Trata-se de realidades sobrenaturais. O reinado de Maria Santíssima sobre o Brasil não é alegórico ou simbólico: é real. Nossa consagração também não deverá ser um ato feito só para estimular as multidões e dar expansão, por meio de gracioso símbolo, a nosso afeto. Será um ato de caráter sobrenatural que, se Deus quiser, se realizará em todas as suas consequências. Consagrado o Brasil a Nossa Senhora, pertenceremos mais a Ela, e com nossa doação repararemos de modo mais conveniente todos os ultrajes que a Ela ou a seu Divino Filho temos feito. E, ao mesmo tempo, Ela será mais nossa. Aceito nosso dom, sua assistência e sua proteção sobre nós serão ainda mais contínuas, mais vigilantes, mais misericordiosas.
Como se vê, não pode haver causa mais digna de ser apoiada com entusiasmo pelos fiéis do  Brasil inteiro.

Plinio Correa de Oliveira - Extraído da Revista “Ave Maria”, nº 31,julho de 1943

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Nossa Senhora do Rosário

Nós devemos festejar a data que a Igreja dedica a Nossa Senhora do Rosário com um empenho especial pela simples razão de que o Rosário é um dos símbolos mais característicos da piedade cristã. Houve tempos em que ele pendia dos hábitos de quase todos os religiosos, ele estava no bolso de todas as pessoas católicas, inúmeras eram as pessoas que eram enterradas com ele nas mãos. Quando se queria simbolizar a piedade, este símbolo era o Rosário.
De maneira que nós devemos olhar para esta festa do Rosário cheios de esperança, e pedir a Nossa Senhora, que ajudou aos cristãos vencerem a Batalha de Lepanto, que nos conceda a graça da vinda do Reino d’Ela, que será também o Reino do Rosário.
Eu já afirmei isso, e volto a fazê-lo: se o nosso Movimento parasse de rezar o Rosário, ele não durava três meses. Eu me pergunto se, na decadência dos dias atuais, ele duraria três dias! Porque para se deixar de rezar o Rosário, tanta coisa teria caído antes, e tanta coisa cairia logo depois, que eu acho que três dias era o máximo para ele se desfazer. Não percamos isto de vista. É a Nossa Senhora, sob a invocação de Nossa Senhora do Rosário, a quem nós devemos tudo.
E assim como dizemos “Gloria Patri et Filio et Spiritui Sancto, sicut erat in principio et nunc et semper...”, talvez pudéssemos afirmar “Glória a Nossa Senhora, como era no princípio, agora e sempre e por todos os séculos dos séculos. Amém”, desde que pela expressão “no princípio” não entendêssemos que Maria Santíssima é a criadora de todas as coisas — o que seria uma aberração —, mas que desde todo o sempre Ela foi a obra-prima da Criação, e estava presente na mente de Deus, que intencionou criá-La para ser, logo abaixo da humanidade santíssima de Jesus Cristo, a maior de todas as perfeições por Ele realizada.
Essa noção da glória de Nossa Senhora, que se traduz nas homenagens que fazemos a Ela, é reflexo do que nós trazemos dentro da alma. E essa glória de Nossa Senhora nós a queremos realizada agora e no Reino de Maria!
A verdadeira glória de Maria
O que é glória?
São Tomás de Aquino define a glória como o efeito que se volta para sua causa e a louva. Então o movimento pelo qual os filhos se voltam para seus pais, os alunos para seus mestres, os súditos para seus governantes e os louvam, os homens — sobretudo — se voltam para Deus e O louvam; todo esse movimento é de glória. Há nisto algo de circular. É o louvor perfeito dado por aquele que deve gratidão perfeita, tributo perfeito, àquele que está na origem, ou da vida terrena, do talento, ou da cultura, das ações acertadas etc., e sobretudo a Deus Nosso Senhor que está na origem de todas as coisas, é a Causa das causas.
Esse conceito de glória nós o verificamos a respeito de Nossa Senhora da seguinte maneira:
A Virgem Santíssima é Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo, e, enquanto Mãe d’Ele, é Mãe do Corpo Místico de Cristo. Por meio d’Ela todas as graças vem aos homens, e todas as orações sobem até Deus. Evidentemente, Ela está, portanto, logo abaixo de Deus, e por desígnio de Deus, no ponto de partida de todas as coisas. E a glória d’Ela será completa quando todos os homens se voltem para Ela e A louvem.
Mas esse louvor não pode ser apenas um cântico da grandeza e da bondade de Nossa Senhora. Tem de ser também o reconhecimento efetivo desta grandeza e desta bondade, o qual se traduz nos atos. Quer dizer, louva Maria Santíssima quem vive de acordo com as virtudes das quais Ela deu exemplo, e pratica essas virtudes com o intuito de honrá-La.
Louva Nossa Senhora, portanto, quem vive conforme as virtudes que a Igreja Católica inculca, porque a Mãe de Deus possui e praticou no mais alto grau todas as virtudes que a Igreja Católica ensina. A Virgem Maria era uma espécie de representação viva da Igreja Católica.
Uma pessoa que olhasse para Nossa Senhora teria, num só golpe de vista, a noção de toda a sabedoria, de toda a continuidade da Igreja, do esplendor de todos os seus santos, do talento dos seus doutores, da beleza de sua liturgia em todas as épocas, do heroísmo de todos os cruzados e de todos os mártires. Enfim, não houve coisa bela que a Igreja tivesse engendrado, e por onde manifestasse o seu espírito, que não brilhasse em Maria Santíssima completamente e com fulgor extraordinário.
Nós, portanto, louvamos a Nossa Senhora, sendo, vivendo e fazendo como a Igreja Católica manda. E exatamente o que fazemos agora, se fará continuamente no Reino de Maria.
Como fazer a vontade de Nossa Senhora?
Como fazemos isto agora? Pode-se dizer que a Igreja se divide em três partes: a Igreja Gloriosa que está no Céu, a Igreja Padecente, no Purgatório e a Igreja Militante, na Terra. Enquanto a Igreja estiver na Terra, ela será militante, lutará. Então os pensamentos da Santíssima Virgem para nosso século não podem deixar de ser pensamentos de luta.
Lembro-me de uma linda escultura gótica que representa Nossa Senhora com um manto todo cheio de dobras e com uma espada na mão, investindo contra o demônio. É esta a tarefa de Maria Santíssima em nossa época.
Alguém dirá: “Mas Nossa Senhora é Mãe, Ela é apresentada na Igreja e nos templos sob o aspecto da misericórdia!”
É verdade. Esta Mãe de misericórdia olha com bondade para a Terra, mas observem os pés d’Ela: esmagam a cabeça da serpente! Quer dizer, é uma luta que só cessará no fim do mundo, quando os demônios que pairam nos ares forem atirados no Inferno, e todos os homens receberem o seu julgamento solene e final, e com isso se terá feito completamente a justiça.
Portanto, se a Virgem Maria se encontrasse, nesta Terra, de maneira visível, estaria estimulando a todos nós à dedicação pela causa d’Ela. Por isso, lutando por Nossa Senhora, estamos fazendo a vontade d’Ela.
E uma das melhores provas de que alguém tem de estar fazendo a vontade da Santíssima Virgem, consiste em ser combatido pelos inimigos d’Ela. Se é verdade que um homem se define por seus amigos, acho que é muito mais verdade que ele se define por seus inimigos. Aquela expressão clássica: “Diga-me com quem andas que te direi quem és”, eu gostaria de completá-la com esta outra: “Diga-me quem te odeia que te direi quem és.”
Porque, com o homem bom, os ruins não erram. E se todos os ruins detestam um homem, este não pode ser ruim, tem que ser bom.
Os maus vivem divididos entre si, e só se coligam contra o bem e contra o bom. De maneira que quando se veem todos os maus cessarem as rixas entre si e se voltarem contra um, este um é necessariamente um bom, porque ele é o denominador comum contra o qual todos os outros se conciliaram e se ergueram. Por exemplo, vemos Anás, Caifás, Herodes e Pilatos apaziguarem as lutas que tinham na pequena Judeia e se ligarem para matar a Nosso Senhor.
Esplendor de Nossa Senhora
Nós tratamos da glória. Mas como será o esplendor de Nossa Senhora?
Na Idade Média, a devoção por excelência, embora não empregassem esta fórmula, era Cristo Rei. Nosso Senhor era cultuado como o grande triunfador. As catedrais do auge daquela época histórica tinham um ar de triunfo magnífico. Eram majestosas, solenes, se levantavam ao céu com uma tranquilidade de quem se sente dono do céu e da Terra. Suas torres davam a impressão de tocar nas nuvens, e seus fundamentos de descer até o centro da Terra. Tinha-se a ideia de que elas dominavam todo o universo. Os vitrais, triunfantes, exprimiam em geral a glória de Cristo que venceu a morte, por quem os mártires venceram as perseguições, os cruzados lutaram; de Cristo por cuja virtude a civilização se erguia, com esplendor nunca igualado, das entranhas de um mundo onde havia o paganismo, o bárbaro e uma latinidade católica sumamente decadente e tíbia. Nosso Senhor Jesus Cristo aparecia como um Pantocrator, sentado sobre um arco-íris e ensinando a toda a Terra.
Daí também o som triunfal dos sinos das catedrais, dos grandes órgãos tocando em todos os seus registros, os grandes cânticos de triunfos da liturgia, as grandes procissões públicas. A Igreja desenvolveu durante o período final do apogeu da Idade Média, em toda a sua plenitude, a sua grandeza e o senso de sua soberania.
Que beleza seria contemplarmos a Idade Média! Sinos começam a tocar diante de um povo que, ao ouvi-los, cessa de trabalhar e começa a fluir para a catedral.
Abrem-se os portais enormes. Nobres, corporações, povos esparsos da cidade vão chegando e entram de Rosário na mão. Uns rezando em grupos, outros isoladamente, em voz baixa. Em determinado momento, tudo se estaca e entra o cortejo dos clérigos: um Bispo com sua mitra, seu báculo, tendo à sua frente todo um clero de mãos postas e que salmodia em latim. Quando o Bispo, revestido de trajes esplêndidos, transpõe o portal da catedral, ele encontra o povo genuflexo. Alguém lhe oferece água benta, ele se benze, toma o hissope e começa a abençoar a todos. O órgão toca, pelos vitrais entra a luz do Sol, o incenso começa a subir. O povo não cabe em si de alegria e põe-se a cantar também, louvando Jesus Cristo, Nossa Senhora, os Apóstolos, a Santa Igreja Católica!
Pois bem. Isto é tão maravilhoso, mas eu digo que é um prenúncio de uma coisa incomparavelmente maior que virá!
A glória do Reino de Maria
Nós teremos catedrais mais belas, mais sacrais, mais esplêndidas do que Notre-Dame, talvez até instrumentos de música que superarão os órgãos e todos os instrumentos anteriores, uma liturgia cuja santidade vai brilhar de um modo mais refulgente que a liturgia anterior, a qual é, entretanto, tão santa e admirável, que se tem vontade de oscular cada uma de suas letras.
Enfim, haverá todo um conjunto de pompas e esplendores que vão simbolizar um domínio radioso e muito mais glorioso de Deus sobre a Terra. E tudo quanto a Igreja tem ensinado ao longo dos séculos, a respeito de Maria Santíssima, vai ser posto na liturgia de um modo muito mais evidente, mais marcante. De maneira que de ponta a ponta, na liturgia, estará presente o princípio da Mediação universal de Nossa Senhora, ensinado por São Luís Grignion de Montfort.
Nossa Senhora será como a lâmpada colocada no mais alto dos candelabros, logo aos pés da imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo, junto ao Santíssimo Sacramento. E nessa esplêndida irrupção da glória de Maria veremos, então, a confirmação de todos os nossos desejos e aspirações.
Se alguém me perguntar: “Dr. Plinio, o senhor não poderia dar um pouco a ideia de como será a glória do Reino de Maria?”, eu digo: “Faltam-me completamente os talentos para isto.” Mas uma coisa todos nós sabemos: a figura dessa glória já começou a nascer no interior de nossas almas. Pela beleza do movimento de alma com que todos juntos desejamos esta glória para Nossa Senhora, pela pulcritude da esperança com que, pela graça de Maria Santíssima e apesar de nossas infidelidades, nós desde já pressentimos com foros de certeza como vai ser esta glória. E na noite e na tempestade, e dentro do lodo, ver este sol de esperança que se levanta, é muito mais do que um simples lírio que nasce na noite e na tempestade; é um sol que fará cessar a tempestade e secará o lodo. A beleza das primeiras cintilações deste sol em algumas almas, que se conservam puras dentro deste lodo, contém na sua raiz toda a pulcritude da glória do Reino de Maria.
Uma meditação dos mistérios gloriosos do Rosário
Para marcar este dia de Nossa Senhora do Rosário, proponho rezar especialmente os mistérios gloriosos do Santíssimo Rosário em homenagem àquelas várias manifestações de glória de Nosso Senhor Jesus Cristo e de Nossa Senhora.
A Ressurreição de Nosso Senhor deve ter sido uma cena de uma majestade inimaginável! A sepultura parada, quieta, escura... De repente um anjo começa a remover a pedra e legiões angélicas entram no sepulcro e enchem-no de luz, e Nosso Senhor sai de dentro da sepultura com o seu Corpo glorioso. Quem pode ter ideia de como foi essa glória?
A Ascensão de Nosso Senhor Jesus Cristo aos Céus: Ele, subindo lentamente e falando, até que sua voz não mais pudesse ser ouvida. Entretanto, cada vez mais resplendente, magnífico e bondoso, comunicando-Se pela irradiação de sua Pessoa mais do que quaisquer palavras. Maria Santíssima e todos os Apóstolos estavam olhando para o céu; os anjos aparecem e dizem: “Homens da Galileia, não temais! Aquele que subiu ao Céu etc.” Quem pode imaginar a beleza e a glória de uma coisa dessas?
Qual terá sido a glória da descida do Espírito Santo sobre Nossa Senhora e os Apóstolos? A coisa mais bonita que tenho visto em minha vida é uma alma se converter ou se santificar. Ver alguém que abandona um defeito e volta para uma qualidade que possuía; ou que regressa ao bom caminho que havia deixado; ou que adquire uma qualidade que ainda não tinha! Nada é mais bonito na Terra do que ver diretamente nas almas a santificação delas operada pelo Espírito Santo.
Alguém será capaz de imaginar o que foi ver o fogo do Divino Espírito Santo cair sobre Maria Santíssima e os Apóstolos? Nossa Senhora habitualmente tão sublime, esplendorosa de alma, de repente recebeu um grau de esplendor que não se imaginava existir.
E as pessoas, olhando a Nossa Senhora, tinham a impressão de estar vendo Nosso Senhor Jesus Cristo em figura feminina, mas, por fim, diriam: “Não, esta é a Mãe de Deus, a Mãe do Salvador!”, de tal maneira Nossa Senhora estava cheia do Espírito Santo. Isso é mais uma glória da qual não podemos fazer ideia.
Depois vem a glória delicadíssima, suavíssima, virginalíssima, maternalíssima de Nossa Senhora assunta ao Céu. Como deve ter sido o “luto” de toda a natureza com Nossa Senhora morta? Eu não posso imaginar! Mas depois, a alegria: Nossa Senhora que ressurge! Nossa Senhora que sai da sepultura! E depois é carregada pelos anjos, ressurrecta e que vai subindo! Enquanto Nosso Senhor manifestava grandeza e bondade na sua Ascensão, Ela manifestava mais bondade do que grandeza. Um sorriso materno, e todos olham para Ela, conhecendo-A mais, compreendendo-A mais, e sendo cada vez mais atraídos por Ela, à medida que vai Se elevando ao Céu, até o momento em que Nossa Senhora desaparece. Mas uma claridade fica espalhada sobre tudo e sobre todos, como quem diz: “Eu, em realidade, fiquei. Rezai porque estarei sempre presente, unida a vós.”
E por fim a festa no Céu, que só os bem-aventurados daquele tempo assistiram: Maria Santíssima entrando no Paraíso, conduzida pelos anjos e sendo recebida por Nosso Senhor Jesus Cristo! Há alguém que possa pintar Nosso Senhor recebendo a Nossa Senhora?
A recompensa demasiadamente grande
Eu creio que só houve uma cena que pudesse dar ideia disso: a Virgem acolhendo Nosso Senhor durante a Via-Sacra. Toda a ternura e adoração d’Ela para com Ele, todo o amor filial, e ao mesmo tempo do Criador, de Jesus para com Ela se manifestaram ali, na dor, de modo admirável. E era preciso ter visto o olhar recíproco entre Eles. Houve algum diálogo, uma pergunta e uma resposta, uma coisa fugidia porque Ele era obrigado a continuar. Mas Nossa Senhora indo depois ao encalço de Nosso Senhor, a troca de olhares do alto da Cruz até o último olhar d’Ele que, com certeza, foi para Ela. E o supremo olhar d’Ela para Ele antes do “consummatum est”.
Era preciso ter visto assim as relações entre Eles para compreender o que foi o olhar com que Nosso Senhor, do alto do trono de sua glória, considerou-A no momento em que Ela entrou para o Céu!
Alguém conseguiria imaginar com que espécie de respeito Nosso Senhor Jesus Cristo — que é Deus! — coroou a Ela, que de corpo e alma estava presente no Céu? Essa glória ninguém consegue descrever, pois excede a tudo quanto se possa cogitar.
Se Nosso Senhor é para cada um de nós a nossa recompensa demasiadamente grande, de que tamanho terá sido a recompensa que Ele foi para Ela? Entretanto, Ele o foi para Nossa Senhora, pois Ele é infinito.
Essas glórias nós as devemos considerar, pedindo a Maria Santíssima que acelere o dia da glória d’Ela!

Plinio Correa de Oliveira – Extraído de conferências de 7/10 dos anos: 1970, 1971 e 1987