sábado, 19 de novembro de 2011

Medalha Milagrosa

Medalha Milagrosa
Quem visita a Capela da Rue du Bac, em Paris, onde Nossa Senhora apareceu a Santa Catarina Labouré e lhe pediu a cunhagem da Medalha Milagrosa, sente-se envolvido por uma intensa impressão de paz, de calma, de céus abertos, como se não existissem obstáculos entre a Terra e a feliz eternidade. No íntimo de sua alma, o fiel ouve a voz de Nossa Senhora, exorável, disposta a atender todos os nossos pedidos, com sua maternal benignidade transpondo distâncias incontáveis para se tornar acessível a nós. Tudo isso faz daquela capela um lugar de serenidade realmente privilegiado.
Serenidade, calma e paz autênticas, ou seja, toques de sobrenatural que afagam nossa alma com verdadeira unção, verdadeira consolação e verdadeira confiança, e nos infunde a plena certeza de que, em última análise, Nossa Senhora nos alcançará as graças tão desejadas por nós.
As aparições da Santíssima Virgem se deram em 1830, sendo a mais importante delas no dia 27 de novembro, quando revelou a Santa Catarina os tesouros de dádivas celestiais destinados ao mundo com a difusão da Medalha Milagrosa.
O sobrenatural se desenrola numa modesta capela
Era esta uma freira da congregação das Filhas da Caridade, fundada por Santa Luísa de Marillac e São Vicente de Paulo. Essas religiosas se distinguiram sempre por sua extrema e abnegada solicitude cristã, dedicando-se ao cuidado dos pobres, órfãos, e enfermos nos hospitais e Casas de Misericórdia. Até há pouco eram conhecidas pelo seu hábito característico: túnica escura com gola branca engomada, a cabeça adornada por uma touca bretã, estilizada pela inspiração e pelas mãos da Igreja. Essa cobertura se desdobrava em duas abas largas, lembrando vagamente as asas de uma gaivota em vôo. Na cintura, como é natural nos hábitos religiosos, pendia um grande rosário. Não tive contato assíduo com essas freiras, mas encontrei-me com muitas delas. Em geral pessoas robustas, fortes e prontas para o trabalho. Olhar límpido, reto, atitude despretensiosa de quem preferia passar desapercebida. Realizavam obras de misericórdia temporal como ocasião para obras de misericórdia espiritual. Ou seja, elas aproveitavam a ocasião de cuidar de um paciente terminal para trazer um padre junto a ele,  para convidar uma criança a ir ao catecismo  da  paróquia,  ou  se  encontravam uma pessoa desventurada na  rua, procuravam ajudá-la em todo o  necessário, etc . Enfim, faziam tudo  quanto pudessem para atender aos  infortúnios,  as  carências  materiais  e, sobretudo, as espirituais, nos mais  variados ambientes por onde costumavam se infiltrar . 
A elevação desse apostolado das  Irmãs de Caridade de São Vicente  de Paulo era tão grande, e as admiravam tanto por isso, que costumavam ser tidas como o próprio símbolo da religião numa de suas expressões mais belas e comovedoras .
O seu principal convento situa-se  num antigo e aristocrático bairro da  capital francesa, o Faubourg Saint-Germain, e se tornou conhecido pelo nome da rua em que foi edificado:  Rue du Bac .
Devemos imaginar a cidade de Paris nos idos de 1830, bem menor e  menos populosa do que é hoje, silenciosa, tranquila, ainda sem ruídos de  motores e luzes de néon. Podemos  pensar na rua calçada com pedras,  sobre as quais, vez por outra, o eco  das patas de um cavalo ou das rodas de uma carruagem interrompia a  longa calada da noite. No dormitório  das freiras de São Vicente, não havia luzinhas azuis, mas talvez alguns  candeeiros acesos . Todas as religiosas repousam, entre elas Santa Catarina Labouré .
Nesse ambiente modesto, puro e  elevado, completamente diverso do  mundo  exterior,  o  maravilhoso  sobrenatural começa a se desenrolar .
Colóquios com a Rainha do Céu
A  primeira  aparição  ocorreu  na  véspera da festa de São Vicente de  Paulo, em 18 de julho de 1830, como que preparada por uma atitude da  vidente  repassada  de  ingenuidade,  inocência e caráter filial muito bonitos. Ela ouvira no dia anterior uma exposição sobre a  devoção a Nossa Senhora, e sentiu um ardente desejo de vê-La. E foi se deitar com o  pensamento de que, naquela mesma  noite, encontrar-se-ia com a Santíssima Virgem .
E foi o que aconteceu . Como nos  relata  a  própria  Santa  Cataria  Labouré, por volta das onze e meia da  noite, ela ouve alguém lhe chamar .  Corre a cortina de seu leito e vê um  menino de 4 ou 5 anos que lhe diz:  “Vinde  à  capela,  a  Santíssima  Virgem vos espera”.
A santa demonstra um poucode receio, temendo  que as  outras  religiosas  a  surpreendessem  fora  da  cama,  mas  o  menino  a  tranquiliza,  ela se veste e começa a segui-lo pelos corredores do convento . Detalhe  curioso, registrado pela vidente que  muito  se  admirou  do  fato:  por  todos os lugares onde passaram as candeias estavam acesas . 
Ela entra na capela e sua surpresa  é ainda maior ao notar todas as velas acendidas nos candelabros, como  se estivessem preparados para uma  Missa do Galo . O menino a conduz  até o presbitério, ao lado da cadeira em que se sentava o vigário . Santa Catarina se ajoelhou, enquanto a  criança permaneceu de pé. Ela, sempre com o receio de que alguma freira passasse por ali e os encontrasse,  pedindo-lhe explicações que não saberia dar . . .
Afinal,  o  menino  lhe  advertiu:  “Eis a Santíssima Virgem” . A vidente ouviu um frou-frou, um roçagar de  vestido de seda, mas ainda não distinguia Nossa Senhora . Então o menino insistiu — já não com voz de  criança, mas em tom vigoroso — que  a  Rainha  do  Céu  estava  presente .  Nesse momento Santa Catarina viu  a Mãe de Deus sentada na cadeira  do vigário, deu um salto para junto  d’Ela e, genuflexa, apoiou suas mãos  nos joelhos de Maria .
Quer dizer, uma cena fabulosa, uma aparição cercada de afabilidade extraordinária.  Compreende-se,  pois, que Santa Catarina tenha registrado esse instante como o mais doce de sua vida, impossível de ser descrito em palavras . Recebeu ali diversos conselhos e orientações de Nossa Senhora, os quais preferiu manter  em sigilo .
A Medalha Milagrosa
Podemos bem conceber como Santa  Catarina se sentiu após esse encontro com Nossa Senhora, e como seu coração latejava de um intenso desejo de revê-La. Alguns meses  depois, ela seria largamente atendida . O segundo e mais importante encontro se deu na tarde do sábado 27 de novembro de 1830 . Assim o relata um cronista das diversas aparições  de Maria:
“Na sua capela da Rue du Bac, as Filhas da Caridade — Irmãs e noviças — se reúnem para a meditação vespertina. Recolhimento e religioso silêncio. De repente, em meio à sua piedosa contemplação, Catarina Labouré julga ouvir o roçar de um vestido de seda... A Santíssima Virgem, ali!
“Qualquer pensamento é impossível diante da inconcebível beleza de Maria. Ela usa um vestido de seda alvíssima como a aurora. Da mesma cor é o véu que Lhe desce da cabeça até os pés. Estes repousam sobre volumoso globo, que parece fixo num ponto do espaço. As mãos, elevadas à altura do peito, sustentam graciosamente um outro globo, menor que o pedestal e encimado por uma cruz. A Virgem tem o olhar voltado para o céu. Seus lábios oram. Ela oferece o globo ao Mestre, seu Filho.
“De súbito o globo desaparece e as mãos permanecem estendidas. Os dedos se cobrem de anéis guarnecidos de cintilantes pedrarias, que emitem raios deslumbrantes para todos os lados. Mil fulgores preciosos se fundem num só brilho transcendente. Mil irradiações circundam a santa figura.
“A Virgem pousa os olhos sobre Catarina em contemplação, abismada num mundo de sensações, de sentimentos, de descobertas, de revelações inexprimíveis. No fundo de seu coração, a noviça ouve uma voz que lhe diz:
“— Este globo representa o mundo inteiro, e especialmente a França, e cada homem em particular.
 “A chuva de raios redobra em força, em magnificência. “— Eis o símbolo das graças que Eu derramo sobre aqueles que mas pedem. As pedras que permanecem na sombra (dirá ainda, uma outra vez, a Santíssima Virgem) simbolizam as graças que se esquecem de me pedir...” 1
Segundo narração de Santa Catarina, formou-se em torno de Nossa  Senhora um quadro de forma ovalada, no alto do qual estavam escritas  em letras de ouro as seguintes palavras: “Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a Vós”. E novamente ela ouviu uma voz que lhe mandava cunhar uma medalha conforme aquele modelo. E a promessa: “Todos os que a usarem, trazendo-a ao pescoço, receberão grandes graças, que serão abundantes para quem a portar com confiança” .
Em seguida, diz a vidente, o quadro pareceu girar e ela viu o reverso  da medalha: no centro, o monograma da Santíssima Virgem, composto pela letra “M” encimada por uma  cruz, a qual tinha uma barra em sua  base. Embaixo, os Corações de Jesus e de Maria, o primeiro coroado  de espinhos, e o outro, transpassado  por um gládio.
Era  o  desenho  da  Medalha  Milagrosa, como esta seria amplamente conhecida e difundida pelo mundo inteiro, alcançando graças e favores celestiais para incontável número de pessoas, milagres de ordem física, como a cura de doenças, e também  de  ordem  espiritual,  reformas  de vida e conversões das mais inesperadas .
Desígnios de alta misericórdia para o mundo
Por exemplo, célebre se tornou a  conversão de um prelado apóstata,  o arcebispo francês Mons. Duprat.  Ele abandonou a Igreja Católica e  se tornou secretário de finanças de  outro famoso bispo renegado, Talleyrand . Conta-se  que  Mons. Duprat,  sabendo chegado aos seus últimos dias, relutava em se confessar e emendar. Algum zeloso parente ou conhecido,  preocupado  com  a  salvação  eterna  dele,  prendeu  a  Medalha  Milagrosa no travesseiro do arcebispo. Foi o bastante para que a graça o tocasse. Dias depois ele pedia que lhe trouxessem um padre: “Mudei de ideia,  desejo  me  confessar”. O sacerdote se apresentou, e o filho pródigo  fez as pazes com Deus, com a Igreja e com a sua consciência . Não se  passou muito tempo, e morreu readmitido no seio da Esposa mística de Cristo.
Casos como esse se multiplicaram  ao longo dos anos e ainda hoje se verificam pelo mundo afora . Assim como  tantas outras formas de amparo e benefício oriundos do uso da Medalha.
Lembro-me,  aliás,  deste  outro  fato .  Uma  senhora  da  aristocracia  francesa mantinha no salão nobre de  sua  residência,  magnificamente  decorado, um quadro com a Medalha  Milagrosa, manchada e amassada no centro. Os visitantes que ela recebia em casa, estranhavam aquilo exposto com tanta evidência num recinto  esplêndido, em meio a objetos de alta categoria, e perguntavam a razão disso. A senhora respondia:
“— Guardo esta medalha porque  meu filho era um estroina, e estando num mau lugar, levou um tiro. A  bala acertou diretamente na medalha, e em vez de perfurá-la, de modo  inexplicável apenas a danificou, como para autenticar o fato extraordinário, e caiu no chão. Diante do prodígio, meu filho se converteu e hoje é um católico modelar. Eu desejo, então, que minhas visitas conheçam  este favor recebido de Nossa Senhora e saibam agradecer. Por isso esta medalha está aqui.”
É simplesmente incontável  o número de episódios semelhantes, onde  foram  obtidas  graças  preciosas  através da Medalha Milagrosa . Motivo pelo qual ela é objeto de tanta devoção, tendo sido destinada por Maria Santíssima a ser um maravilhoso  meio  de  se  realizarem  desígnios  de  sua alta misericórdia para o mundo .
Expressão do carinho materno de Maria
É  interessante  frisar,  ainda,  que  essa particular proteção da Virgem  Santíssima em relação a nós transparece muito na sua prerrogativa de Mãe da Divina Graça.
Quantos já não nos sentimos, ao  aproximarmos de uma imagem sob  essa  invocação,  recebidos  por  um  sorriso d’Ela, envolvidos por uma espécie  de  doçura  que  nos  prometia  compaixão, pena, a convicção de sermos atendidos e favorecidos por um  ato de inesgotável bondade?
É a certeza de que Nossa Senhora  sempre se acha disposta a nos socorrer e amparar com sua clemência, seja em nossas carências materiais e físicas, seja marcadamente em nossas lacunas espirituais, ajudando-nos a vencer nossos defeitos, as tentações e o  pecado . Portanto, Nossa Senhora das  Graças podia se dizer Nossa Senhora da Misericórdia, que nunca, nunca,  nunca nos deixará desamparados.
E  creio  jamais  ser  suficiente  insistir nesta verdade: Mãe da Divina  Graça significa a tesoureira de todas  as graças de Deus . As dádivas celestiais constituem um tesouro inexaurível, posto nas mãos de Nossa Senhora  e  por  Ela  difundido  àqueles  que recorrem à sua intercessão.
Maria é a dispensadora de todas  as graças e também a Mãe dos que  Lhe suplicam favores . Mãe dos miseráveis, dos aflitos, daqueles que quase perderam a esperança, aos quais  Ela reanima, e faz reacender em seus  corações a chama da Fé.
Basta  considerarmos  uma  imagem de Nossa Senhora das Graças  para compreendermos o quanto esse  título exprime o carinho materno de  Maria em relação a nós . Acolhe-nos  de braços abertos, o sorriso nos lábios, repassada de um convite amorável para nos aproximarmos e convivermos um pouco com Ela . Envolve-nos com uma afabilidade e uma  promessa de perdão sem limites, insondável . E nos faz ouvir no fundo  da alma a sua voz carinhosa: “Tendes  a Mim, sou inteiramente sua . E por  causa disso, todos os caminhos para  o Céu lhe são franqueados . . .”