terça-feira, 29 de março de 2011

Nossa Senhora das Vitórias


Numa praça de forma caprichosa, Place des Petits Pères, situada não muito longe do Louvre, em meio a um emaranhado de ruas muito pitorescas, típicas da velha Paris, ergue-se a Basílica de Nossa Senhora das Vitórias.

Um guia turístico a qualifica de igreja com “ar provinciano”...

Entretanto, quem penetra por suas antiqüíssimas portas de carvalho, caminha por suas naves e se interessa por sua história, compreende que é um desses lugares impregnados de sobrenatural, onde as graças de Deus foram derramadas em abundância.

De fato, trata-se de uma construção despretensiosa, mas ali a História e as graças de Deus se entrelaçaram de maneira admirável.

Origem do santuário

Por que Nossa Senhora das Vitórias?

Transcorria o ano de 1629. Os destinos da França estavam nas mãos de Luís XIII, o justo, que dirigia seus exércitos para expulsar os ingleses do último reduto que possuíam neste país. Os aguerridos estrangeiros tinham em seu poder o porto de La Rochelle, muito bem defendido. A batalha se apresentava difícil para os franceses. O Rei Cristianíssimo fez uma promessa a Nossa Senhora: se suas tropas saíssem vitoriosas, dedicaria um templo à Santíssima Virgem das Vitórias e a Ela consagraria a França.



O que parecia irrealizável, conseguiu-se: os ingleses se renderam e abandonaram o solo da Gália.
Luís XIII colocou pessoalmente a primeira pedra do templo, em 9 de dezembro de 1629. Encravada no coração de Paris, a igreja passou por todas as vicissitudes e revoluções da História da França.
Porém, a partir do século XIX, converteu-se em um centro de fervor e de religiosidade indescritíveis. Como sucedeu isso?

Confraria do Imaculado Coração de Maria, fonte de fervor

Em 1836 foi nomeado pároco de Nossa Senhora das Vitórias o Padre Desgenettes, homem muito virtuoso e zeloso pela salvação das almas.

Esse bom sacerdote se afligia enormemente pela ausência de fiéis. A igreja permanecia continuamente vazia, e à principal missa de domingo assistiam apenas três ou quatro dezenas de senhoras. O Padre Desgenettes pensava, rezava, mas não sabia o que fazer para afervorar os habitantes do bairro.

Um dia, enquanto celebrava solitário a Eucaristia, escutou claramente uma voz que lhe dizia: “Consagra tua igreja e a paróquia ao Santíssimo e Imaculado Coração de Maria”. Olhou para todos os lados e não viu ninguém. Terminada a missa, fazendo a ação de graças no coro, novamente escutou a mesma voz, que lhe repetia: “Consagra tua igreja e a paróquia ao Santíssimo e Imaculado Coração de Maria”.

Admirado e tomado de emoção, convenceu-se de que era um aviso do Céu, e agradeceu à Santíssima Virgem. Retirou-se a seu escritório, redigiu os estatutos da Confraria do Imaculado Coração de Maria e pensou: “Vou agora mesmo ao arcebispado. Se o arcebispo me atender e aprovar estes estatutos, isto significará que se trata verdadeiramente de algo do Céu.” E partiu sem demora.

O prelado, Dom Haycinthe-Louis de Quélen, recebeu-o imediatamente, leu os estatutos e lhe disse: “Meu querido Padre Desgenettes, não só aprovo essa confraria, mas lhe ordeno que a estabeleça a partir do próximo domingo”. Era uma sexta-feira...

Chegado o domingo, o pároco anunciou, durante a homilia, às habituais trinta e tantas senhoras, que naquela mesma tarde começariam as reuniões da confraria do Imaculado Coração de Maria para a conversão dos pecadores.

Após o almoço, quando se aproximava a hora marcada, na casa paroquial o Padre Desgenettes estava aflito, receoso e um tanto desconfiado. “Virá alguém? Serão as senhoras de sempre ou alguém mais? Não terá sido tudo uma ilusão?” O demônio o tentava: “Tolo! Isso é pura fantasia, te enganaste! Quem virá num domingo à tarde a uma reunião na paróquia? É melhor ir dormir e esquecer de tua famosa confraria!”

Mas o pároco, movido de zelo pela salvação das almas e pela glória de Deus, fez um ato de confiança e saiu da casa paroquial rumo à igreja.

Oh surpresa! O recinto sagrado transbordava de gente. Não cabia mais nem um alfinete! E um terço dos presentes era de homens! Que coisa maravilhosa!

Um fervor novo e prodigioso

Cheio de alegria e reconhecimento, o Padre Desgenettes iniciou a reunião e leu os estatutos da Confraria. Ao final, todos cantaram a ladainha da Santíssima Virgem. Então deu-se outro fato que, se não for milagroso, ao menos foi um prodígio. Ao chegar na invocação “Refúgio dos pecadores”, todos se ajoelharam e a repetiram três vezes, sem que ninguém tivesse programado ou dirigido algo. Foi uma ação “espontânea”... do Espírito Santo!

O pároco deu a Nossa Senhora das Vitórias outros três títulos: Coração Imaculado de Maria, Mãe do Bom Conselho e Refúgio dos pecadores.

A partir daquele momento, Notre Dame des Victoires transformou-se num braseiro de fervor que incendiou toda Paris, a França e o mundo inteiro.

Prova disso são as 35 mil placas que cobrem suas paredes. Quem se dá o trabalho de lê-las, corre o risco de emocionar-se. Ingleses, alemães, americanos, mexicanos, poloneses agradecem: um por ter saído vivo de um naufrágio, outro de uma guerra; outro por ter recuperado a fé; uma filha pede a conversão de seu pai e a obtém; uma mãe, a saúde de seu filho. É uma infinidade de graças, misérias e misericórdias. Uma curiosa inscrição assim diz: “O pobre estudante recorreu a Nossa Senhora das Vitórias em 1889. O jovem médico lhe agradece em 1896”.

Ao mesmo tempo, choviam cartas ao Padre Desgenettes, de pessoas pedindo para serem registradas na Confraria. Uma delas chegou de uma aldeiazinha quase desconhecida, perto de Lyon, assinada por João Maria Vianney... o Santo Cura D’Ars.

Visitantes ilustres por sua santidade e por sua linhagem

Este fervor fez com que muita gente de fora de Paris, ao passar pela capital, visitasse a Basílica. Entre os peregrinos encontramos São João Bosco, que celebrou Missa no altar de Nossa Senhora. A angélica Santa Teresinha do Menino Jesus ali se prostrou a fim de pedir graças para sua viagem a Roma, e recebeu a certeza de que fora a própria Virgem Santíssima quem a curara, na infância, de uma estranha enfermidade. Ela relata esta visita em uma das mais belas páginas de sua célebre autobiografia, “História de uma alma”.


Certo dia, ajoelha-se ante Nossa Senhora das Vitórias uma dama de aspecto nobre e distinto, acompanhada de um sacerdote. Rezam longamente, longamente... Quem são? Isabel II, Rainha da Espanha, e Santo Antônio Maria Claret, Arcebispo, confessor da Rainha e fundador da grande Congregação do Coração de Maria.

A Rainha, como sinal de sua gratidão e amor a Nossa Senhora das Vitórias, deixa uma lembrança: duas pequenas mesas de bronze, especiais para colocar velas, tendo na base o escudo da Espanha, em belo esmalte. Essas mesas ali estão até hoje.

Uma provação para Dom Chautard

Um fato digno de nota se passou com Dom João Batista Chautard, monge trapista francês, célebre mestre da vida espiritual.

Muito antes de ser eleito abade da Trapa de Sept fons, ele recebeu de seus superiores a ordem de providenciar o sustento de vários mosteiros de sua ordem, que se encontravam em extrema necessidade econômica.

O piedoso religioso foi a Paris visitar pessoas abastadas e solicitar-lhes ajuda. Os resultados não foram satisfatórios.

Tomando conhecimento das graças que Nossa Senhora derramava na Igreja das Vitórias, correu a seus pés. Contudo, teve uma perplexidade: quando chegou ante a imagem, foi tomado de uma terrível aridez, desengano e falta de ânimo para esperar qualquer coisa. Manteve-se longo tempo rezando, mas sem sentir nada. Um tanto desanimado, levantou-se e dirigiu-se à porta, pensando que Nossa Senhora talvez não havia escutado sua oração. Ao chegar ao átrio, uma elegante senhora o abordou e perguntou:

— Dom Chautard?

— Para servir-lhe, senhora.

— Pois, olhe, trouxe este envelope para o senhor.

Era exatamente o que Dom Chautard necessitava para seus mosteiros. Entrou novamente na igreja — desta vez bem mais consolado... — para agradecer a Nossa Senhora.

Há muitas outras maravilhas que Maria realizou nesse santuário. Se fores a Paris, não deixes de visitar a Basílica de Nossa Senhora das Vitórias, embora os guias turísticos não lhe dêem o devido valor.