sábado, 30 de julho de 2011

Razão de nossa serenidade

Mãe incomparavelmente perfeita entre todas as mães, Nossa Senhora nos conhece, ama e quer bem com discernimento, bondade, paciência e carinho de uma intensidade extraordinária. Alcança-nos tudo o que nos convém e lhe pedimos confiantemente. Está disposta a nos obter o perdão de seu Divino Filho, mesmo para nossas piores faltas; alcançar-nos as graças necessárias para nossa emenda, nossa salvação e, assim, brilharmos diante d’Ela por toda a eternidade. É a misericórdia dessa Mãe de perfeição incalculável.
Por isso mesmo, é Ela a razão de nossa serenidade. Não temos motivo para estarmos perturbados nem agitados, posto termos uma Mãe celeste que se compadece de nós e nos acompanha a todo instante com sua insondável solicitude. Devemos permanecer sempre tranquilos: nossa Mãe vela por nós.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Confiança e determinação contra o pecado

É próprio ao homem, à medida que cresça, desejar lutas cada vez maiores. Devemos procurar subir aos píncaros da seriedade, galgar as culminâncias do esforço, fiéis à Lei de Deus e, mesmo quando tivermos a impressão de que tudo nos convida para o mal, dizer: “Salve Rainha, Mãe de misericórdia...”
Sejamos realistas: cada um possui todos os meios para não pecar, mas ninguém pode garantir que não cairá. Precisamos nos preparar. Se acontecer a desgraça, a catástrofe de cometermos um pecado mortal, devemos confiar, não desesperar, mas imediatamente nos dirigir até os pés de uma imagem de Nossa Senhora ou segurar o Rosário e dizer: “Salve Rainha, Mãe de misericórdia”, “lembrai-vos, ó piíssima Virgem Maria, que nunca se ouviu dizer — nunca se ouviu dizer! — que alguém tivesse recorrido à vossa proteção e fosse por Vós desamparado... Gemendo sob o peso dos meus pecados, me prostro a vossos pés...”
É a prece não apenas do homem inocente, mas também do que cometeu pecados e se lamenta sob o peso deles, podendo mesmo acrescentar: “Se nunca se ouviu dizer, não seja eu o único infeliz em que se desminta vossa clemência. Mil vezes não! Ó minha Mãe, reerguei-me, dai-me ânimo para ir me confessar e continuar sempre e sempre essa luta que me levará ao Céu!”
Peçamos aos anjos, aos santos, aos nossos padroeiros, que nos obtenham uma pureza, a qual nunca conheça manchas, bem como a confiança por onde, se por desgraça uma nódoa tisnar nossa alma, nos voltemos mais uma vez a Nossa Senhora, dizendo: “Minha Mãe, vossa misericórdia é maior do que minha miséria, tende pena de mim”, e retomemos a carga contra o pecado. É o que vos desejo de modo muito especial.
Importa nos lembrarmos de que os demônios no inferno provavelmente se enchem de ódio ao ouvir essas palavras.
Porém, a Virgem Maria, sob a invocação de Nossa Senhora das Graças, calca aos pés a cabeça da serpente, esmaga e sempre esmagará o demônio. Assim, sob a proteção d’Ela, imitando-A, deveis levar vossa vida subjugando o mal dentro de vós, rejeitando as tentações e trabalhando pelo advento do Reino de Maria.
Somente conseguiremos isso se formos autênticos devotos de Nossa Senhora. Conforme explica São Luís Grignion, precisamos fazer todas as vontades d’Ela, as quais conheceremos cumprindo antes de tudo os Mandamentos da Lei de Deus e da Igreja, observando-os durante a vida inteira por amor a Nossa Senhora.
Na vida de uma pessoa há situações em que ela tem a impressão de ser um navio abandonado no meio da tempestade, jogado de um lado para outro pelos ventos das tentações, dos problemas, e parece que o navio afundará.
Mas, a nau tem um capitão: o próprio homem. Se ele rezar, tomar todas as precauções, não desistir mesmo quando julgar que o mar inteiro está entrando na embarcação, aos poucos a tormenta vai amainando.
Quando a Providência Divina permite que passemos por tais provações, Ela está nos concedendo uma honra. Assim, cada um de vós, nas ocasiões difíceis, não se ache abandonado. Pense o contrário: “Estou convocado para uma grande batalha! É uma honra! Minha Mãe e de Jesus Cristo meu Senhor, tende misericórdia de mim e ajudai- me! Vou pôr mãos à obra, e ensinar a esta tempestade como são as coisas!”
Pedi a Nossa Senhora, antes de tudo, uma intensa Fé Católica Apostólica Romana; que Ela vos dê a convicção e a rejeição do mal que há no pecado, bem como a admiração pelo bem existente nas virtudes.
Dessa forma, tereis a glória de participar do desfile dos vencedores, quando for implantado o Reino de Maria, prometido pela Virgem Santíssima em Fátima, ao anunciar o triunfo final do seu Imaculado Coração sobre a face da Terra.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Estava a Mãe dolorosa, ao pé da Cruz, lacrimosa, e o Filho pendente dela.

Eia Mãe fonte de amores, fazei que essas fortes dores eu sinta e convosco chore.
Fazei que a alma se me inflame, para que a Cristo Deus só ame e só busque o seu agrado.
Santa Mãe, isso vos peço, fique o peito bem impresso das chagas do Crucificado.
Fazei-me, enquanto viver, com meu Jesus condoer, convosco chorar deveras.
A cena aqui descrita, de Nosso Senhor pendente da Cruz e Nossa Senhora em pé (pois este é o significado de stare, em latim), chorando, é a mais patética de toda a história do mundo.
Nunca houve situação mais trágica do que essa, nem nada que se lhe comparasse. Diante desse quadro que deveria comover todos os homens, adquire especial relevo aquelas várias preces.
Caráter sagrado das relações mãe-filho
Para compreendermos o inteiro alcance desse cântico, convém considerarmos a relação Filho-Mãe.
No alto do Calvário se encontra Nosso Senhor, na força de sua idade, pregado na Cruz, exposto a um tormento indizivelmente agudo, com o Corpo todo chagado devido aos maus tratos anteriores, a coroa de espinhos ferindo-Lhe a cabeça, prestes a exalar sua alma. Passou por todas as dores e se acha no fim da agonia. D’Ele se poderia dizer, metaforicamente, como o fez a Sagrada Escritura: “Já não era um homem, mas um verme” (Sl 21, 7), e reputado “como um leproso” (Is 53, 4), de tal maneira estava desfigurado, chagado e lanhado.
Conforme predissera o Profeta Isaías, do alto da cabeça até a planta dos pés não havia em Jesus parte sã. Ora, a pessoa nessa situação pungente, própria a despertar a compaixão de todo o mundo, é ao mesmo tempo o Homem-Deus. Sendo o Inocente, e sofrendo o martírio mais injusto, humilhado pela ralé mais infame, tudo quanto contra Ele se executava assumia uma gravidade verdadeiramente infinita. Cometia-se, portanto, um pecado imenso, algo que deveria levantar de indignação até as pedras.
Pois bem, ao pé da Cruz estava a Mãe do Supliciado.
Nada se respeita tanto no mundo quanto uma mãe que chora junto a seu filho morto. Isso faz cessar todas as hostilidades, apodos, qualquer espírito de vingança, toca e inclina as almas para a misericórdia. É a fraqueza feminina no que tem de mais sublime, a condição de mãe posta diante do que há de mais doloroso: o falecimento de seu próprio filho.
Tais sentimentos se verificam inclusive em se tratando do pior dos criminosos, digno da maior execração, justamente condenado à morte. Quando, nas vésperas de sua execução, anuncia-se a visita da mãe dele, tudo se suspende. A irritação despertada contra o sentenciado como que recebe um parênteses, todos acolhem sua progenitora com respeito e a conduzem junto ao filho que ela deseja consolar. E esse réu, objeto da reprovação geral, enquanto está com sua mãe adquire — pela sua condição de filho — uma respeitabilidade a qual pareceria impossível em semelhante facínora. Ninguém o atormenta nem o incomoda. Suspende-se o curso da justiça, até que o contato com sua mãe tenha cessado.
Tudo isso porque a relação mãe-filho é sagrada, envolve reservas de ternura inimagináveis. Em razão do que ela tem de sacrossanto em si, aplaca as cóleras e impõe toda forma de respeito.
Misérias da sensibilidade humana
Ora, no Calvário está a mais perfeita de todas as mães, chorando a ofensa feita a Deus com uma profundidade de sentido que não podemos sequer imaginar. Em face dessa cena compungente ao extremo, era de se presumir que a piedade humana naturalmente se enternecesse.
Se presenciássemos a crueldade de alguém que mata uma cachorra, abandonando à própria sorte os filhotes dela sem terem quem lhes procure alimento, sentiríamos uma impressão desagradável, teríamos pena. Pois somos assim, e nos enternecemos — às vezes exageradamente — com a dor sofrida pelos animais.
Então, se temos Fé e acreditamos que Nosso Senhor Jesus Cristo é Deus e morreu na Cruz para nos salvar, que Nossa Senhora existiu e estava ao pé da Cruz, deveríamos ter nossa alma partida de dor e nada poderia nos falar tanto quanto essa situação.
Entretanto, devido à miséria da sensibilidade humana, dá-se algo de inconcebível: os mesmos que se deixam comover pelo infortúnio de um bicho, diante da Paixão se tornam “glaciais”, e dizem: “Já sabemos disso, hããã...”. A Morte de Nosso Senhor é uma das estações da Via Sacra. Dos que a rezam, quantos não têm a atenção voltada para outros assuntos? E quantos, mais numerosos, nem sequer dela participam, alegando ocupações mais importantes?
Essa indiferença humana é tão marcante que, depois de apresentar esse quadro, muito judiciosamente o Stabat Mater acrescenta quatro orações nas quais pedimos a Deus algo que deveria borbulhar do fundo das almas: o sentimento de arrependimento, compunção, gratidão; o desejo de aproveitar para si os frutos dessa Redenção, daquelas lágrimas, daquele Sangue, para progredirmos na prática do bem.
Por que existe tal indiferença? Porque esse tema é bonito, elevado, santo, grandioso demais. E pela sua natureza decaída com o pecado original, o homem se tornou tão ruim que, em presença de algo muito sublime, santo e elevado, fica completamente insensível. Há todos os motivos para chorar e se compungir, mas não chora nem sente compunção.
Pedir a graça da verdadeira compunção
Cumpre termos presente que o autêntico movimento de piedade provém de um ato de Fé e amor a Deus, frutos da vida sobrenatural recebida por nós através da graça. Não a podemos adquirir por simples méritos de nossa natureza.
Assim, temos de pedir e desejar ardentemente essa graça insigne: que a Paixão de Nosso Senhor não seja para nós uma coisa morta, poeirenta e distante, ocorrida há séculos, e sim algo de vivo que nos diz respeito diretamente, e nos toque no fundo da alma como sucedeu a todos os santos.
Esse “tocar no fundo da alma” não significa apenas um mero sentimento de tristeza, mas também de solidariedade para compreendermos a inteira relação do holocausto de Jesus conosco, movendo-nos a um ato de genuíno amor a Deus e de correspondência às graças.
Nosso Senhor e a Santíssima Virgem sofreram todas essas dores na intenção de salvar os homens, e mesmo que fosse para resgatar só a mim, as teriam padecido. Eles me conheciam pessoalmente no momento desse sacrifício, pensaram em mim e o aceitaram para me redimir.
Assim, hei de corresponder a tanta misericórdia, deixarei de pecar e progredirei na virtude. Quero salvar almas e implantar o Reino de Maria na Terra, como a plena retribuição àquilo que na Paixão foi realizado.
É, portanto, esse movimento de alma, sensibilizada pela Paixão, que devemos pedir nas orações.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Nossa Senhora, saúde dos enfermos

Panacéia celestial
Não raras vezes, a Providência permite que se abatam sobre o homem as mais aflitivas doenças corporais, para que se volte humildemente a Nossa Senhora e suplique sua cura. Ao se ver atendido, conhece ele a insondável bondade materna de Maria, sentindo-se atraído e conquistado pela melhor de todas as Mães. E mesmo quando Esta não alivia o mal físico, não deixa de consolar a quem Lhe pede, fazendo ver ao doente o benefício que recebe com a cruz, para a sua santificação — que é o bem-estar da alma.
Por isso é Maria invocada como a Saúde dos enfermos, como o remédio para as nossas moléstias, mas, sobretudo, para as carências de alma, defeitos e lacunas espirituais.
Em relação a estes a Santíssima Virgem é, por excelência, a “panacéia” celestial dada por Deus para nos livrar de tantas misérias e nos conduzir à plenitude de santidade à qual somos chamados.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Bendita Mãe de Deus

"Bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus” — dizemos a Nossa Senhora quando recitamos a Ave-maria, depois de A exaltarmos como bendita entre todas as mulheres.
Ela, excelência do gênero feminino, transmitiu essa maravilhosa primazia ao Esperado das Nações, o Messias, o Redentor do mundo. A Escritura nos apresenta grandes heroínas da fé e da virtude, virgens e mães santas, cujo elogio os autores sagrados se comprazem em cantar. Porém, nenhuma outra mereceu o incomparável louvor que o Anjo trouxe do Céu para manifestá-lo a Maria Santíssima. Ela é o pináculo das mulheres, o píncaro das mães.
Entre todas Bendita, deu-nos o Bendito entre todos.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

O Magnificat, hino de sabedoria, humildade e grandeza

Único cântico que se sabe proferido por Nossa Senhora em sua vida terrena
Entoado por Nossa Senhora no encontro com Santa Isabel, o Magnificat é um maravilhoso hino inspirado pelo Altíssimo, é Deus cantando sua própria glória pelos lábios da mais amada das suas filhas. É, também, uma linda mensagem, coerente, lógica e séria, que Ele transmitiu a todos os homens de todos os séculos, pela voz virginal de Maria.
O cântico se inicia com a palavra Magnificat — do latim magnus, isto é, grande — para enaltecer Aquele que é a Grandeza personificada, reconhecendo que Deus merece este superlativo de louvor e de honra na sua glória extrínseca, passível de crescimento, por haver realizado n’Ela, Virgem bendita, o cumprimento da maior e mais alvissareira promessa divina feita à humanidade: a Encarnação do Verbo.
A exultação em Deus, seu Salvador
Então a alma d’Ela se apressa em extravasar o seu sentimento de profunda gratidão, proclamando como o Senhor assim se revelava o magno por excelência.
Em seguida, vem a alegria “E o meu espírito exulta!”
Exultar é sentir um júbilo intenso, e não uma qualquer satisfação, como a que poderia experimentar alguém se soubesse que os seus investimentos renderam um pouco além do esperado. Esta seria uma alegria pequena, perto daquela que se exprime pela palavra “exultação”. Por isso Nossa Senhora a emprega, para significar como seu espírito transbordou de gáudio em relação a Deus, o seu magnífico Salvador.
Essa felicidade se mostra tanto mais intensa quanto, conforme o pensamento que se completa no versículo seguinte, Ela considera a sua pequenez e vê como Deus a salvou de modo extraordinário, super-excelente, não só fazendo d’Ela a Mãe do Verbo Encarnado, mas dispondo que Ela tivesse em toda a existência de Nosso Senhor Jesus Cristo o papel admirável que sabemos.
Legítima alegria por ter sido engrandecida
Depois de afirmar a sua exultação, a Santíssima Virgem manifesta então o motivo dessa imensa alegria: “porque Deus olhou para a humildade da sua Serva”. Em conseqüência dessa atenção do Senhor para com Ela, “eis que, de hoje em diante, todas as gerações me chamarão bem-aventurada”, isto é, todos os homens até o fim do mundo, vão por sua vez enaltecê-La, chamando-A, bem-aventurada.
 Porque me fez grande Aquele que é poderoso”. Percebe-se aqui, mais uma vez, o gáudio de Maria por ter sido objeto de um especial desígnio do Onipotente: Ela, tão humilde, tornou-se grande pela força d’Ele.
Há, nessa passagem, um interessante ensinamento que deve ser considerado.
Alegrando-se com a grandeza divina, Nossa Senhora ao mesmo tempo se alegra com o fato de ter sido também engrandecida por uma condescendência d’Ele, e sabe que essa sua magnitude  Lhe valeria o louvor e a devoção das gerações vindouras. É uma glória única, que a cobre de felicidade, e pela qual, cheia de reconhecimento, agradece a Deus.
Ora, essa atitude de Nossa Senhora aceitando, auferindo e amando a própria excelência, demonstra como é legítimo nos alegrarmos com a grandeza que Deus eventualmente nos conceda. Desde que, a exemplo de Maria, esse júbilo esteja alicerçado no amor a Ele, compreendendo que essa glória estabelece uma relação mais íntima entre nós e o Criador.
 E o Seu Nome é Santo”. Quer dizer, “Deus agiu assim para comigo, e procedeu santamente”. Essa fabulosa obra que o Senhor realizava na sua serva, vinha marcada pela infinita perfeição com que Ele modela tudo quanto sai de suas mãos onipotentes.
Misericórdia para os que temem a Deus
Após ter manifestado de tal maneira a grandeza de Deus e a sua própria, Nossa Senhora evoca o aspecto de bondade: “e a misericórdia d’Ele se estende de geração em geração, sobre aqueles que O temem”.
Significa que o fato de Deus A ter feito tão grande redunda num benefício e numa obra de misericórdia de que se aproveitarão todos os homens em todas as épocas da História. Com uma restrição, porém:  aqueles que temem a Ele.
Eis outra importante lição a ser colhida do Magnificat.
O temor se divide em servil e reverencial. O temor servil é aquele que tem, por exemplo, um escravo ao fazer a vontade de seu dono pelo receio de sofrer duros castigos se não obedecer. O temor reverencial é aquele que alguém demonstra em relação a outrem, não por medo das penalidades que lhe possa infligir, mas por respeito e veneração pela superioridade dele, por não querer ultrajá-lo nem violar a obediência que deve a ele.
Um exemplo maravilhoso de temor reverencial encontramos nas ardorosas palavras que Santa Teresa de Jesus dirige a Nosso Senhor: “Ainda que não houvesse Céu, eu vos amara; ainda que não houvesse inferno, eu vos temera”. Quer dizer, ainda que Deus não lançasse à geena aqueles que se revoltam contra Ele, por ser Ele quem é e pelos infinitos títulos que Ele possui acima de nós, temeríamos não fazer a vontade d’Ele. É essa a forma altíssima e nobilíssima do temor reverencial.
Então, aos que amam a Deus com um amor tal que até O temem — não apenas por causa do inferno, mas sobretudo por não querer desagradá-Lo na sua infinita santidade —, para estes se abre a inesgotável misericórdia de Deus: “e cuja misericórdia se estende de geração em geração sobre aqueles que O temem.”
Cumpre salientar que, muitas vezes, a bondade divina não se prende a essa restrição, superando-se em requintes de solicitude até mesmo para com homens que pouco ou nenhum temor de Deus experimentavam, antes de serem tocados pela graça e se converterem.
Pode-se supor, por exemplo, que São Paulo na via de Damasco não tivesse temor de Deus. Mas, atingido por um raio, ele caiu do cavalo, perdeu a visão, e logo ouviu a voz de Nosso Senhor que o interpelava. Quando se levantou, era outro homem, tornando-se o grande Apóstolo dos gentios. Era uma extraordinária ação da misericórdia divina — muito provavelmente a rogos de Maria — estendendo-se sobre uma alma que até então não temia a Deus.
Queda dos soberbos e exaltação dos humildes
“Manifestou o poder do seu braço, e dissipou aqueles que se orgulhavam nos pensamentos do seu coração”.
 Entendamos o que significa “manifestar o poder de seu braço”. Trata-se de uma metáfora, pois Deus, puro espírito, não possui braço. Este, porém, é no homem o membro pelo qual ele mostra a sua força e executa os decretos de sua inteligência e de sua vontade. Então, ao se referir ao “braço de Deus”, Nossa Senhora nos faz ver como Ele age energicamente em relação aos soberbos e orgulhosos, àqueles que se fecham para a ação da graça e não O temem nem O amam nos seus corações. Para com esses, Deus manifesta o poder de seu braço.
O pensamento se completa no versículo seguinte: “Depôs de seus tronos os poderosos, e exaltou os humildes”.
Por meio da Encarnação do Verbo, Deus quebrou o poder com que o demônio e seus sequazes neste mundo atormentavam os bons. Então, depôs aqueles de seus tronos, e exaltou a estes que eram perseguidos.
Alguém poderia objetar: “Mas, não foi o que aconteceu. Deu-se o contrário! Anás, Caifás, Pilatos e congêneres, todos se achavam nos seus tronos, perseguiram e mataram Nosso Senhor!”
 É verdade. Mas essa história não está narrada até o fim. Porque depois de Jesus ter sido morto, aconteceu precisamente o que aqueles poderosos queriam evitar: Ele ressuscitou, triunfando sobre a morte e sobre todos os seus algozes. Com Ele, triunfava a Santa Igreja, venciam os Apóstolos e Nossa Senhora, os humildes até então desprezados. E para todo o sempre, serão estes glorificados e exaltados, enquanto Anás, Caifás e Pilatos serão mencionados com vitupério e horror. Então se comprovou a veracidade do dito: Depôs de seus tronos os poderosos, e exaltou os humildes”.
Essa idéia ainda prevalece na seqüência do cântico: “Cumulou de bens os famintos, e despediu os ricos com as mãos vazias”.
Nossa Senhora não pretende fazer aqui uma alusão aos recursos materiais ou financeiros. Ela se refere, antes de tudo, aos que se acham na carência de bens espirituais, aos indigentes das dádivas celestiais. A esses pobres de espírito que, humildemente, suplicam essas graças, Deus os atende na abundância infinita de sua misericórdia. Pelo contrário, aos “ricos”, àqueles que se julgam inteiramente satisfeitos no seu orgulho, Deus os despede de mãos vazias, isto é, sem torná-los partícipes do tesouro de seus dons sobrenaturais.
Em Maria, cumpre-se a promessa feita a Abraão
Por fim, Nossa Senhora volta à idéia central que inspira esse hino maravilhoso: “Tomou cuidado de Israel, seu servo, lembrado da sua misercórdia”.
Quer dizer, o Povo Eleito receberia em breve o Messias há milênios prometido, a Quem Deus enviaria ao mundo, recordando que sua misericórdia assim havia disposto. Daí a conclusão: “Conforme tinha dito a nossos pais, a Abraão e à sua posteridade para sempre”.
A promessa feita a Abraão, fundador da raça hebraica, e aos descendentes dele ao longo dos séculos, de que o Salvador nasceria de sua progênie, acabava de ser cumprida. Nossa Senhora já trazia em seu claustro materno o Esperado das nações. Ela, uma filha de Abraão, daria à luz o Filho de Deus.
E assim o Magnificat, esta jóia inapreciável, este maravilhoso cântico de sabedoria, humildade e grandeza, muito harmoniosamente se encerra pensando na Encarnação do Verbo, como o fizera na primeira estrofe.



sexta-feira, 8 de julho de 2011

A mesma Mãe



Entre o Verbo encarnado e nós há algo em comum, algo insondavelmente precioso: temos a mesma Mãe! Mãe perfeita desde o primeiro instante de seu ser concebido sem mácula. Mãe santíssima de tal maneira que, em cada momento de sua existência, não cessou de corresponder à graça; apenas cresceu, cresceu e cresceu até alcançar inimaginável elevação de virtude.
Essa Mãe, d’Ele e nossa, tem misericórdia do filho mais esfarrapado, torto, desarranjado; e quanto mais desarranjado, torto e esfarrapado, maior sua compaixão materna. Minha Mãe: aqui estou eu. Tende pena de mim hoje, agora, como sempre tivestes e, espero, sempre tereis. Purificai-me, ordenai-me, tornai minha alma cada vez mais semelhante à vossa e à d’Aquele que, como a mim, é dada a indizível felicidade de vos ter por Mãe!

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Nossa Senhora do Carmo

O manto do Carmo
Assim como vestiu seu Filho Jesus com uma túnica de valor inapreciável, Maria Santíssima quer nos revestir, a nós, seus filhos adotivos, com a mais eficaz das vestimentas.

Antecipando o monacato católico, uns tantos discípulos de Elias escolheram o alto do Monte Carmelo para, ali, abraçar a contemplação. Assim permaneceram na sucessão das gerações, até a vinda do Senhor. Vários deles se converteram depois de Pentecostes e foram os primeiros a erigir um oratório em louvor a Nossa Senhora.
Tácito relata-nos que o Imperador Vespasiano subia ao Monte Carmelo para consultar um oráculo, e lá ouvia as orientações de um sacerdote chamado Basilido que, a certa altura, prognosticou-lhe um grande sucesso (1).
Outro historiador, Suetônio, reforça o relato feito por este, acrescentando que Vespasiano ia ao Carmelo à procura de uma confirmação de seu destino e de suas cogitações, e de lá retornava cheio de ânimo (2).
Autores de peso discutem entre si, se o oratório lá existente seria de origem pagã ou se, de fato, já se tratava de um santuário dedicado à Santíssima Virgem. Entretanto, inteiramente certa é a enorme antiguidade da Ordem do Carmo.
Depois de Elias, seu discípulo Eliseu continuou a habitar aquela montanha, rodeado de “filhos dos profetas” (cf. 2Rs 2,25; 4, 25; 4,38, etc.). Conhece-se ali uma “gruta de Elias” e uma caverna chamada de “Escola dos Profetas”.
Mas o primeiro documento da História que chegou até nós, mencionando um grupo de eremitas no Monte Carmelo, é da metade do séc. XII. Viviam eles sob a direção de um exmilitar de nome Bertoldo. Em 1154 ou 1155, um parente deste, Aymeric, Patriarca de Antioquia, o orientara no estabelecimento do eremitério. A um monge grego, João Focas, que o visitou em 1185, São Bertoldo contou ter-se retirado com dez discípulos para o Carmelo em virtude de uma aparição de Santo Elias. Essa comunidade recebeu pouco depois, do Patriarca de Jerusalém, Santo Alberto, uma regra, que foi emendada e definitivamente aprovada pelo Papa Inocêncio IV, em 1247. Estava, assim, constituída a Ordem do Carmo.
A primeira vestimenta foi confeccionada por Deus
A primeira veste de que se tenha notícia na História remonta ao Paraíso Terrestre. Conta-nos o Gênesis (3, 21) que, após a queda de nossos primeiros pais, Adão e Eva, o próprio Deus lhes confeccionou túnicas de pele e com elas os revestiu. Bem mais tarde, Jacó fez uma túnica de variadas cores para o uso de José, seu filho bem-amado (Gn 37, 3). E assim, as vestimentas vão sendo citadas nestas ou naquelas circunstâncias, ao longo das Escrituras (Gn 27, 15; 1 Sm 2, 19; etc.). Uma túnica porém, ocupa lugar “princeps” entre todas as vestimentas: aquela sobre a qual os soldados deitaram sorte, por se tratar de uma peça de altíssimo valor, pelo fato de não possuir costura. Uma piedosa tradição atribui às puríssimas mãos de Maria a arte empregada em sua confecção. Ao se darem conta, os esbirros, da elevada qualidade daquela peça, tomaram a resolução de não rasgá-la.
Assim vestia Maria a seu Filho Jesus, desde o seu nascimento, como esmerada e devotada Mãe. E da mesma forma quer revestir também a nós, seus filhos adotivos, Aquela que “como névoa cobre a terra inteira”. Pois a Ela fomos entregues na mesma ocasião em que os soldados, pela sorte, decidiam sobre a propriedade da túnica de Jesus: “Mulher, eis aí teu filho” (Jo 19,26).
E que roupa nos oferece Ela?
O Escapulário, uma das mais eficazes vestimentas
Em 1251, a Virgem Santíssima apareceu a São Simão Stock, sexto geral da Ordem do Carmo, entregando-lhe um escapulário e prometendo a todos aqueles que o usassem, verem-se livres da condenação eterna. Décadas mais tarde (1322), o Papa João XXII concedeu aos carmelitas o privilégio sabatino, ou seja, todos aqueles que morressem usando o Escapulário seriam libertos do fogo do Purgatório no sábado subseqüente ao falecimento.
Eis, pois, uma das mais eficazes vestimentas, além de ser um magnífico símbolo de aliança, proteção e salvação.
Papas enaltecem o uso do Escapulário
Em 1951, por ocasião da celebração do 700º aniversário da entrega do Escapulário, o Papa Pio XII disse em carta aos Superiores Gerais das duas Ordens carmelitas: “Porque o Santo Escapulário, que pode ser chamado de Hábito ou Traje de Maria, é um sinal e penhor de proteção da Mãe de Deus”.
Exatamente 50 anos depois, o Papa João Paulo II afirmou: “O Escapulário é essencialmente um ‘hábito’. Quem o recebe é agregado ou associado num grau mais ou menos íntimo à Ordem do Carmo, dedicada ao serviço da Virgem para o bem de toda a Igreja. (...) Duas são as verdades evocadas pelo signo do Escapulário: de um lado, a constante proteção da Santíssima Virgem, não só ao longo do caminho da vida, mas também no momento da passagem para a plenitude da glória eterna; de outro, a consciência de que a devoção para com Ela não pode limitar-se a orações e tributos em sua honra em algumas ocasiões, mas deve tornar-se um ‘hábito’.”
Esses dois Pontífices confirmam, assim, manifestações de apreço ao Escapulário feitas por vários de seus antecessores, tais como Bento XIII, Clemente VII, Bento XIV, Leão XIII, São Pio X e Bento XV. Bento XIII estendeu a toda a Igreja a celebração da festa de Nossa Senhora do Carmo, a 16 de julho.

sábado, 2 de julho de 2011

Inestimável socorro para os pecadores

Maria Santíssima, como a melhor de todas as mães, desdobra-se em solicitudes e bondades em relação a seus filhos, de modo especial para com aqueles que gemem sob o peso de seus pecados. A estes oferece Ela os tesouros de sua insondável misericórdia, a fim de resgatá-los e conduzilos à salvação eterna.
ladainha composta por São João Eudes.

Conhecido  por  sua  doutrina  sobre  os  Sagrados  Corações de Jesus e Maria, São João Eudes escreveu esta bela ladainha de invocações a Nossa Senhora:
Ave Maria, Filha de Deus Padre.
Ave Maria, Mãe de Deus Filho.
Ave Maria, Esposa do Espírito Santo.
Ave Maria, templo de toda a Divindade.
Ave Maria, alvíssimo lírio da Trindade, fulgurante e sempre sereno.
Ave Maria, rosa resplandecente de celestial amenidade.
Ave Maria, Virgem das Virgens, Virgem fiel, de quem quis nascer e de cujo leite quis se amamentar o Rei dos Céus.
Ave Maria, Rainha dos Mártires, cuja alma foi transpassada pelo gládio da dor.
Ave Maria, Senhora do mundo, a quem foi dado todo poder no Céu e na Terra.
Ave Maria, Rainha do meu coração, Mãe, vida, doçura e esperança minha caríssima.
Ave Maria, Mãe amável.
Ave Maria, Mãe admirável.
Ave Maria, Mãe de misericórdia.
Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco; bendita sois Vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.
E bendito é o vosso Esposo, São José. E bendito é o vosso Pai, São Joaquim.
E bendita é a vossa Mãe, Sant’Ana. E bendito é São João, a quem fostes confiada ao pé da Cruz.
E bendito é o vosso Anjo, São Gabriel. E bendito é o Eterno Padre que vos escolheu.
E bendito é o vosso Filho que vos amou.
E bendito é o Espírito Santo que vos esposou. E benditos são eternamente os que vos bendizem e crêem em Vós.
Maternal convite à conversão
Essas invocações, além de belas e tão expressivas, encerram grande valor espiritual, pois,  segundo  o  autor  que as publica, o próprio São João Eudes “recomendava que se recitasse esta prece para a conversão dos pecadores e prescrevia a seus filhos a dissessem na cabeceira dos doentes.
“A Santa Virgem lhe prometeu que todos que a recitassem com devoção e boa vontade, se estivessem em estado de graça, Ela lhes aumentaria a devoção em seus corações, a cada uma das saudações ou bênção.”
Portanto, cada invocação alcançaria uma graça especial, um aumento da devoção a Nossa Senhora. 
“E se estivesse em pecado mortal, com sua mão doce, virginal, Nossa Senhora bateria na porta dos pecadores, a cada saudação ou bênção que dissessem, convidando-os a se abrir para a graça”.
Ou seja, um favor extraordinário de Maria Santíssima. A cada uma dessas invocações dita pelo pecador em estado de pecado grave, Nossa Senhora lhe bate à porta da alma, convidando-o a uma emenda, ao arrependimento e à penitência.
“E acrescentou que, em relação às pessoas empedernidas no pecado e difíceis de converter, seria salutar incitá-las a dizerem de bom grado essa oração. Ou, pelo menos, concordarem que a oração seja dita por elas, o que lhes faria igualmente bem.”
Compreende-se, então, como essa ladainha de invocações constitui um importantíssimo meio de conversão, e um valioso instrumento de santificação.
As três primeiras invocações se referem à Nossa Senhora como Filha de Deus Padre, Mãe do Filho Encarnado e Esposa do Divino Espírito Santo, e formam a trilogia mariana apreciada por muitos santos, teólogos e doutores. Dessa ladainha, elas se desprenderam como três sóis, três estrelas para constituírem um tesouro especial no firmamento da Igreja.
Creio que nunca será demasiado recomendar esta linda prece a todos os católicos, mormente aos que, por infelicidade, se encontrem sob o jugo do pecado.